sexta-feira, março 15, 2019

O outro lado do vento, de Orson Welles ****


Toda a carreira artística do diretor norte-americano Orson Welles se pautou em uma fascinante tensão criativa entre um lado classicista em termos formais e um forte fator de inovações e experimentação de linguagem cinematográfica. “O outro lado do vento” (2018), seu filme “perdido” lançado recentemente, é uma extensão dessa marca autoral do cineasta, assim como reflete estética e existencialmente a época em que foi realizado (os anos 70).  Naquela década, Welles já se encontrava distante dos grandes estúdios e tinha dificuldades para concluir seus projetos em função de dificuldades econômicas. Ao mesmo tempo, era uma época em que o cinema norte-americano passou por profundas transformações provocadas pelos egressos da Nova Hollywood (um deles, Peter Bogdanovich, tem importante participação no resultado final de “O outro lado do vento”). Também foi um tempo em que o cinema exploitation se encontrava em voga nas telas pelo mundo inteiro. “O outro lado do vento” é síntese de todas essas características e dilemas artísticos do período com a notória e indelével veia autoral de Welles. A narrativa é fragmentada, a fotografia se sobressai pela estilização, há várias cenas marcadas por sexo e violência e o roteiro tem um subtexto intrincado e que flerta com a metalinguagem e o autobiográfico, e tudo isso é filtrado pelo barroquismo muito particular do diretor. É Welles se mostrando atento às principais tendências formais e temáticas da época, mas as manipulando com radical ousadia e entregando um resultado final desconcertante e memorável.

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