quinta-feira, outubro 08, 2015

Leviatã, de Andrey Zvyagintsev ***

Os prêmios e os inflamados elogios de boa parte da crítica que a produção russa “Leviatã” (2014) ganhou ao redor do mundo são até compreensíveis. Apesar da estrutura narrativa convencional e rigorosa de melodrama, o filme dirigido por Andrey Zvyagintsev é uma crítica severa e inclemente contra a desumanização e degradação existencial promovida pelo avanço global de um capitalismo selvagem e agressivo através da história simbólica do veterano pescador Kolia (Alekesey Serebryakov) que tem a sua vida familiar e profissional destroçada pelas maquinações do poder público corrupto de sua cidade e interesses comerciais de grandes corporações. O mote do roteiro pode parecer manjado, mas são em alguns detalhes estéticos e temáticos que a obra de Zvyasintsev se diferencia do lugar comum. Para começar, a caracterização emocional concebida pelo cineasta é áspera e sem concessões – a trajetória de Kolia é uma descida vertiginosa num pesadelo burocrático e pessoal. Ainda que a ambientação e encenação tenham forte caráter naturalista, a impressão sensorial da obra é de uma descida ao inferno. Pela trama, há determinados momentos que corresponderiam àquelas “viradas” de história em que os “mocinhos” começariam a dar a volta por cima, mas acaba sendo um truque perverso do roteiro justamente para enfatizar o lado da inevitabilidade do destino quando forças poderosas econômicas e políticas, com apoio inclusive das instituições religiosas, se voltam contra um indivíduo comum. Por vezes, a conturbada derrocada de Kolia evoca uma atmosfera kafkaniana, mas os motivos que levam ao debacle do personagem estão longe de serem absurdos e inexplicáveis.

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