quinta-feira, abril 19, 2018

Em pedaços, de Fatih Akin ***


A condição de filho de imigrantes sempre foi um fator existencial-artístico preponderante na filmografia do diretor alemão Fatih Akin. E não apenas em termos temáticos – em seus filmes mais expressivos, o conjunto de formalismo e roteiro apresentava um vigor renovado, como se abarcassem o melhor de mundos diferentes, tanto em um rigor estético típico do cinema europeu quanto no exotismo e vivacidade das influências étnicas inerentes à cultura oriental, permitindo-se ainda a claras referências e citações da cinematografia norte-americana. Ou seja, um cinema deliciosamente mestiço. Em pedaços (2017) é fruto dessa concepção autoral de Akin, mas dessa vez a narrativa se mostra mais presa dentro de uma formatação convencional e previsível. Se Soul Kitchen (2009) era uma recriação particular, frenética e divertida de clichês de diversas vertentes da comédia (pastelão, romântica, de erros), temperada por um sutil prisma sócio-político, essa produção mais recente envereda por uma insólita junção de preceitos narrativos de melodrama, thriller “de vingança” e filme de tribunal. A ligação entre os gêneros cinematográficos não é fluente, e por vezes a rigidez da encenação e os lugares comuns da trama induzem ao enfadonho. Entretanto, ainda que esteja distante de representar um ponto alto na carreira de Akin, Em pedaços tem os seus pontos positivos que mostram que o cineasta ainda é um nome acima da média. Isso fica evidente na sequência em que a protagonista Katja (Diane Kruger) tenta o suicídio aos cortar os pulsos na banheira, de uma mórbida e perturbadora beleza imagética. Além disso, a narrativa tem uma atmosfera de notável sobriedade emocional, impedindo que tudo caia no sentimentalismo barato. O expressivo conteúdo humanista do roteiro também cria uma forte empatia com a plateia, fazendo com que seja difícil ficar indiferente ao filme. De certa forma, a impressão geral é que Akin quis fazer a sua versão pessoal de Desejo de matar, ainda que a sua queda para um tradicionalismo narrativo mais acessível tenha impedido seu longa de atingir maiores voos criativos.

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