A condição de filho de
imigrantes sempre foi um fator existencial-artístico preponderante na
filmografia do diretor alemão Fatih Akin. E não apenas em termos temáticos – em
seus filmes mais expressivos, o conjunto de formalismo e roteiro apresentava um
vigor renovado, como se abarcassem o melhor de mundos diferentes, tanto em um
rigor estético típico do cinema europeu quanto no exotismo e vivacidade das
influências étnicas inerentes à cultura oriental, permitindo-se ainda a claras
referências e citações da cinematografia norte-americana. Ou seja, um cinema
deliciosamente mestiço. Em pedaços (2017)
é fruto dessa concepção autoral de Akin, mas dessa vez a narrativa se mostra
mais presa dentro de uma formatação convencional e previsível. Se Soul Kitchen (2009) era uma recriação
particular, frenética e divertida de clichês de diversas vertentes da comédia
(pastelão, romântica, de erros), temperada por um sutil prisma sócio-político,
essa produção mais recente envereda por uma insólita junção de preceitos
narrativos de melodrama, thriller “de vingança” e filme de tribunal. A ligação
entre os gêneros cinematográficos não é fluente, e por vezes a rigidez da
encenação e os lugares comuns da trama induzem ao enfadonho. Entretanto, ainda
que esteja distante de representar um ponto alto na carreira de Akin, Em pedaços tem os seus pontos positivos
que mostram que o cineasta ainda é um nome acima da média. Isso fica evidente
na sequência em que a protagonista Katja (Diane Kruger) tenta o suicídio aos
cortar os pulsos na banheira, de uma mórbida e perturbadora beleza imagética.
Além disso, a narrativa tem uma atmosfera de notável sobriedade emocional,
impedindo que tudo caia no sentimentalismo barato. O expressivo conteúdo
humanista do roteiro também cria uma forte empatia com a plateia, fazendo com
que seja difícil ficar indiferente ao filme. De certa forma, a impressão geral
é que Akin quis fazer a sua versão pessoal de Desejo de matar, ainda que a sua queda para um tradicionalismo
narrativo mais acessível tenha impedido seu longa de atingir maiores voos
criativos.
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