terça-feira, fevereiro 12, 2019

Singapore Sling, de Nikos Nikolaidis ****


Em sua época áurea, nas décadas de 1940 e 1950, o cinema noir era marcado por uma fascinante ambiguidade artística – influenciado esteticamente pela literatura policial “pulp” e pelo expressionismo alemão, toda a perversidade e sordidez presente em seu subtexto tinha que se adaptar aos moldes narrativos tradicionais do cinema comercial norte-americano da época e, principalmente, aos padrões morais dos códigos de condutas dos grandes estúdios. A produção grega “Singapore Sling” (1990) parte de um pressuposto artístico inquietante – se não houvesse essas limitações da época em que se desenvolveu, como seria o cinema noir? A resposta oferecida pelo resultado final do filme dirigido por Nikos Nikolaidis pode parecer puramente especulativa, mas também oferece alguns momentos memoráveis na sua síntese entre clichês narrativos de filme policial clássico, toques de exploitation e forte teor experimental. Roteiro e encenação deixam aflorar de maneira impiedosa escatologia, incesto, ostensivo brutalismo gráfico, despudorada sexualidade e um doentio senso de humor, tudo filtrado dentro de uma concepção formal de forte rigor plástico e perpassado por uma atmosfera entre o melancólico e o poético. No todo, é uma obra inclassificável e desconcertante, o que ajuda explicar porque foi proibida em alguns países ou simplesmente nem foi exibida comercialmente em outros mercados (inclusive o Brasil). É necessário, entretanto, que apreciadores de um cinema que vá além das grandes bilheterias ou de premiações do Oscar corram atrás dessa pérola de insólita beleza.

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