Assim como em sua obra anterior, “Ela volta na quinta”
(2015), o diretor André Novais Oliveira volta o olhar da sua câmera para um
registro do cotidiano utilizando um estilo narrativo que evoca trejeitos
documentais em “Temporada” (2018). Apesar da aparente secura de tal abordagem,
aos poucos seu filme vai revelando uma subjetividade ímpar que envolve sutilmente
o espectador. Na história da protagonista Juliana (Grace Passô) que busca reiniciar
a vida em um emprego público de baixa remuneração e de contato diário com as
ruas da periferia da cidade mineira de Contagem há todos as durezas e privações
típicas do proletariado brasileiro no conturbado cenário sócio-econômico
brasileiro dos últimos anos (aliás, vale dizer de um proletariado que de
maneira regressiva vai ser convertendo em um precariado). Ainda assim, o
cineasta vai contaminando sua narrativa com um pungente viés intimista/humanista,
em que a rotina da personagem principal repleta de agruras também ganha uma
perspectiva otimista a partir de um rico panorama de conversas, camaradagens, flertes
e pequenas conquistas do dia-a-dia. Mesmo uma cidade aparentemente tão
desprovidas de encantos como Contagem por vezes ganha belos contornos
imagéticos (a sequência em que Juliana e um amigo conversam sentados diante de
um pequeno lago contaminado por esgoto, por exemplo, tem uma insólita dimensão
poética) – faz lembrar aquele inesquecível trecho de canção dos Racionais MC’s,
“até no lixão nasce flor”. Tais achados narrativos afloram a partir de uma
concepção artística/existencial rigorosa e coerente por parte de Novais
Oliveira, em que uma estética que sabe extrair rudeza e plasticidade nas
medidas certas de seus cenários convive com notável sintonia com um roteiro muito
bem delineado no desenvolvimento de seus personagens e situações.
Um comentário:
“Temporada” é um dos mais belos filmes desse início de ano do nosso cinema brasileiro. Saiba mais no meu blog https://cinemacemanosluz.blogspot.com/2019/01/cine-dica-em-cartaz-temporada.html
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