quinta-feira, abril 11, 2019

Bio - Construindo uma vida, de Carlos Gerbase ***


A filmografia do diretor gaúcho Carlos Gerbase, pelo menos em termos de longas-metragens, se divide entre esforçadas tentativas e filmes francamente ruins. Assim, “Bio – Construindo uma vida” (2017) acaba sendo uma surpresa positiva, pois é seu longa melhor sucedido em termos artísticos. A encenação talvez tenha sido o grande ponto fraco de suas produções anteriores, sendo que nessa obra mais recente ele finalmente consegue resolver esse problema ao formatar o seu filme como um falso documentário com elementos de ficção científica, melodrama e comentário sócio-político-histórico. Na maioria das sequências, os personagens estão sentados dando depoimentos de fluência e ritmo que beiram o literário. A concepção estética-temática aqui descrita pode sugerir algo confuso ou simplesmente esdrúxulo, mas o mérito de Gerbase é dar para tudo isso uma fluência narrativa envolvente, além do roteiro revelar um subtexto de nuances humanistas comoventes. Nesse sentido, também é interessante observar como a abordagem política-existencial de “Bio” ganha uma ressonância especial na associação que se faz com o tenebroso momento histórico que vivemos. Com sutileza irônica demolidora, a obra satiriza o obscurantismo religioso e a educação baseada em alienação e valores morais reacionários perpetrados pelo status quo conservador, valorizando, por outro lado, as ciências e as artes como forma de libertação e transcendência. Por vezes o longa padece de fotogenia e assepsia visual excessivas, mas esse é um detalhe negativo que se compensa por algumas ousadias, como a atilada direção de atores, a caracterização estilizada de um futuro high tech e o misto de serenidade melancólica e humor sardônico de algumas passagens da trama. Aliás, a forma engenhosa como a ficção científica é incorporada na narrativa parece em sintonia com o fato de que Gerbase por muito tempo foi baterista e compositor dos Replicantes, cujo nome é referência óbvia ao clássico sci fi “Blade Runner – O caçador de androides” (1982) e as letras de algumas das canções citavam um futurismo nebuloso.

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