Se a estrutura narrativa caótica de “Ornette: Made in
America” (1985) evoca a música repleta de improvisos e experimentações de seu
protagonista, o documentário “Diga amém, alguém” (1982) se vincula a um
formalismo mais convencional em sintonia com o caráter tradicional do ritmo
musical que coloca em cena, o gospel. Isso não quer dizer que o filme dirigido
por George T. Niereberg seja menos inquietante, pois dentro dessa estética
baseada em modelos clássicos a obra consegue transmitir muito da força
artística e emocional do gospel. O documentário se focaliza em duas figuras
importantes do gênero, o compositor e cantor Thomas A. Dorsey e a cantora
Willie Mae Ford Smith, com uma narrativa que se baseia em dois elementos
bastante utilizados no cinema verdade concentrado na temática musical:
depoimentos dos protagonistas e “coadjuvantes” (parentes, amigos, admiradores)
e números musicais. Só que Niereberg executa tais princípios com brilho e
convicção, sabendo extrair tanto informações preciosas quanto emoções genuínas
nas entrevistas, além de valorizar com sensibilidade todos os saborosos
detalhes cênicos das apresentações musicais nos cultos. E não se trata aqui de
querer converter espectadores para o protestantismo – filme não se interessa em
se aprofundar no proselitismo religioso, dando a entender que o fator místico
seria um oportuno pretexto na elaboração e interpretação de uma música de
caráter tão transcendente e intenso, além de enfatizar em algumas pequenas
nuances o teor conservador e machista da visão de mundo do protestantismo, em
uma curiosa contradição com as expansivos e pungentes canções que provem de
seus cultos.
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