Para o diretor português João Botelho, não bastava
simplesmente adaptar o original literário de “Os Maias – Cenas da vida
romântica” (2014) para dentro de uma linguagem cinematográfica. Para o
cineasta, primordial era preservar a essência temática da obra e valorizar a
prosa lapidada ao extremo do escritor Eça de Queiroz. Para isso, Botelho
recusou a simples encenação naturalista e apostou numa estilização formal
acentuada. A produção se baseia em truques estéticos simples e na empostação
dos diálogos. É como se a preocupação não fosse que aquilo que se vê em tela
fosse crível ou acessível para o espectador moderno, interessando mais criar
uma determinada atmosfera que se preocupasse em colocar o espectador dentro de
um vórtice sensorial. Nesse sentido, a Lisboa que se revela na obra é quase
difusa, beirando o onírico – parece uma capital portuguesa do século XIX que
habita o imaginário de um possível leitor apaixonado de Eça. O texto que brota
da tela através da narração e dos diálogos vem num tom solene, por vezes
declamado. Ao invés do anacronismo tedioso, tal recurso provoca um estranho
encantamento pela força e encadeamento dessas palavras e diálogos que denotam
uma ampla gama de sentimentos e sensações. A trama de “Os Maias” pode sugerir
em sua superfície uma tragédia novelesca, mas nas suas entrelinhas traz um fino
senso de humor a satirizar as hipocrisias e mesquinharias da sociedade
portuguesa da época. É grande mérito de João Botelho saber preservar essas
geniais nuances da escrita de Eça, traduzindo esse clima de decadência sedutora
em várias sequencias antológicas, o que fica evidente principalmente nas cenas
em que a ácida metralhadora verbal de João da Ega (Pedro Inês) se manifesta e
na lassidão perturbadora da última sequência de sexo entro Carlos da Maia (Graciano
Dias) e Maria Eduarda (Maria Flor).
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