O diretor argentino Matias Piñeiro volta a usar em “A
princesa da França” (2014) maneirismos estéticos e temáticos que já apareciam
em obra anterior sua, “Viola” (2012). Só que nessa produção mais recente a
impressão é de que ele aprofunda e radicaliza ainda mais a sua insólita
proposta artística. A abertura do filme já deixa claro as suas intenções – num belo
e longo plano-sequência, é mostrado uma partida de futebol-cinco numa quadra em
que duas equipes de cores diferentes vão se tornando um time só. Ou seja, em “A
princesa da França” é a vez do surrealismo dar às caras com força considerável.
Nesse viés, a narrativa fica fragmentada, com Piñeiro filmando uma mesma
situação do roteiro por diversas vezes, sendo que em cada tomada o
direcionamento dos fatos é diverso, assim como as próprias atitudes dos
personagens. É como se o cineasta burilasse soluções narrativas e ficasse com
todas aos mesmo tempo. Tais escolhas formais podem parecem estranhas, mas
acabam revelando forte sintonia com outros aspetos característicos da estética
de Piñeiro como sua encenação livre e vigorosa, as caracterizações do elenco
que primam por uma esquisita síntese entre o nonsense e a profundidade
dramática, o cruzamento metalinguístico entre os ensaios de uma peça teatral e
a vida pessoal dos seus atores, a direção de fotografia seca e elegante que
evoca uma atmosfera quase documental. E talvez ainda resida boa parte da essência
artística do cinema de Piñeiro: a impressão de se estar assistindo a um
registro beirando o onírico do cotidiano.
Nenhum comentário:
Postar um comentário