Numa entrevista recente para a televisão, o violonista
Yamandu Costa disse algo bem interessante – a de que quando as pessoas
supostamente conversavam sobre música com ele, na realidade elas falavam de
tudo (fama, dinheiro e afins), menos sobre a música em si. O documentário “Joe
Strummer: O futuro está para ser escrito” (2008) tem uma relação forte com esse
pensamento de Yamandu. O filme tem como temática a trajetória artística e
pessoal do líder da mitológica banda punk The Clash, mostrando os seus anos de
formação antes do surgimento da banda, o período de criatividade intensa e
grande sucesso comercial de quando o Clash estava na ativa, o longo hiato no
ostracismo de Strummer após a dissolução do grupo, a retomada vigorosa da
carreira solo e a morte repentina. O documentário não se limita a uma mera
amostragem cronológica dos fatos – o diretor Julien Temple tem a bela sacada
narrativa de deixar evidente boa parte do lado subjetivo, ideológico e criativo
de Strummer, mostrando os dilemas e contradições que moviam a sua inspiração
como músico e compositor, além de contextualizar com sensibilidade todo a rica
ambientação cultural e social que o envolvia. Muito mais do que resumir a
carreira de Strummer a um critério mercadológico e reducionista do quanto ele
teve sucesso comercial ou não, Temple oferece um amplo e fascinante panorama do
amadurecimento existencial tanto do artista quanto do ser humano, em que fica
evidente de maneira pungente o jovem em busca de conhecimento e de uma
linguagem artística própria, o indivíduo de ideias políticas radicais e
emocionalmente imaturo que se enredeia nas armadilhas do showbusiness, o homem
que longe dos holofotes adquire serenidade e sabedoria e o veterano músico que
sintetiza suas influências e visões pessoais numa arte atemporal. A formatação
criada pelo cineasta tem uma notável sintonia com o particular estilo cultivado
por Strummer ao longo dos anos, abusando de colagens e outros truques de edição
que dão a impressão de um fervilhante caleidoscópio de imagens e ideiais,
intercalando ainda com recursos tradicionais no gênero (entrevistas e imagens
de arquivo) e uma espécie de encenação em que amigos e admiradores de Strummer
conversam ao redor de uma fogueira. Esse conjunto estético dá à produção uma atmosfera
rústica e espontânea, como uma boa e velha canção do Clash.
Boa parte de amigos e conhecidos costuma dizer que as minhas recomendações para filmes funcionam ao contrário: quando eu digo que o filme é bom é porque na realidade ele é uma bomba, e vice-versa. Aí a explicação para o nome do blog... A minha intenção nesse espaço é falar sobre qualquer tipo de filme: bons e ruins, novos ou antigos, blockbusters ou obscuridades. Cotações: 0 a 4 estrelas.
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