terça-feira, abril 19, 2016

Elles, de Malgorzata Szumowska ***

Pode soar sexista ou sectário dizer que há obras cuja perspectiva existencial indica um autor de determinado gênero. Mas falar isso para um filme como “Elles” (2012) não pode ser considerado um reducionismo. O olhar do filme é feminino no sentido de contestar um ordenamento moral e ético que é típico de uma sociedade patriarcal. Nesse sentido, o trabalho da diretora Malgorzata Szumowska é bastante inquietante na sua formatação narrativa e nos questionamentos sociais que apresenta com sutil ironia. Quando a jornalista Anne (Juliette Binoche) mergulha no mundo das jovens prostitutas universitárias para escrever uma matéria, percebe aos poucos que deverá deixar de lado preceitos maniqueístas e pseudosociológicos para ter uma efetiva noção da real dimensão daquele universo. Com o desenrolar da trama, outros pontos entram em pauta – a subjetividade de cada uma das garotas de programa, a distorção das relações humanas dentro de uma sociedade capitalista baseada na exploração, o papel de submissão e anulação da protagonista dentro da sua própria família. O filme não apresenta soluções prontas ou fáceis para os dilemas que apresenta, e talvez esse nem fosse o seu objetivo. O que interessa para Szumowska é mais uma atmosfera ambígua na dicotomia entre atração e repulsa que aquele novo mundo representa para Anne, estabelecendo um encadeamento de cenas e situações que variam de forma desconcertante entre várias sensações e sentimentos (erotismo, desejos difusos, sordidez, culpa, delírios). O formalismo de “Elles” acompanha essa complexidade temática, tendo uma encenação que tanto se caracteriza em alguns momentos pela leveza sensual quanto por uma pesada solenidade dramática, enquanto a dinâmica da montagem cria um vórtice temporal hipnotizante na variação dos tempos narrativos e ambientações entre o real e o onírico.

Nenhum comentário: