Depois de recriar o gênero suspense de maneira bastante
peculiar no brilhante “O estranho do lago” (2012), o diretor francês Alain
Guiraudie monta uma narrativa idiossincrática e fascinante em “Na vertical”
(2016). O cineasta parece buscar inspiração na encenação crua e libertária de
Pasolini e nas atmosferas delirantes e sardônicas dos melhores trabalhos de
Luis Buñuel, com um resultado final que está muito longe do derivativo. Por
vezes, até se tem a impressão de se estar assistindo a uma espécie de conto
moral distorcido e que se desenvolve por uma lógica temática-formal muito
particular. Ao mesmo tempo, cada nuance imagética da austera direção de
fotografia, a edição de ritmo sóbrio e o roteiro de desenvolvimento
desconcertante e de estranha coerência revelam um tremendo rigor artístico em
termos de concepção e execução da narrativa. Nenhuma das escolhas criativas de
Guiraudie é marcada pela gratuidade ou a simples procura do choque – o caráter
explícito e bizarro das sequências de sexo, a caracterização de situações e
personagens que sintetizam viés naturalista e onirismo, a reinterpretação
irônica da mitologia cristã e a constante sensação de uma realidade em desagregação
reforçam um discurso artístico de forte caráter humanista e de grande ousadia
estética.
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