Pelo menos em termos temáticos, não há grandes novidades em “Big
Jato” (2015). Adaptando um original literário de Xico Sá, o filme mais recente
do diretor Cláudio Assis é uma versão fílmica de um “romance de formação”, ou
seja, de uma obra que versa sobre o processo de amadurecimento de um
protagonista. Nesse sentido, estão lá os dilemas típicos desse tipo de produto
cultural – os desejos e aspirações de um jovem, o duro aprendizado que a vida
lhe oferece, suas desilusões amorosas, o desencanto com a falsa infalibilidade
dos pais, a necessidade de expansão dos horizontes, a consequente despedida da
casa familiar e até da própria cidade em que nasceu. Nesse sentido, até a cena
de conclusão do filme é de talhe clássico e tradicional – o encontro entre o
protagonista Francisco (Rafael Nicário) e o mar pela primeira vez. O fato da
trama se passar numa cidade do interior do nordeste brasileiro também dá um
caráter ainda mais simbólico para a obra, pois o tal processo de mudança
existencial de Francisco também corresponde a alterações no quadro social da
comunidade, numa nem tão sutil alusão elogiosa às mudanças provocas por mais de
uma década de um governo de esquerda. Mas o que diferencia realmente o filme de
Assis como uma produção acima da média em termos artísticos não é esse lado
temático, mas sim a criatividade de seu formalismo e o lirismo de sua
abordagem. É notável como a poesia se insere dentro da narrativa, tornando-se
uma espécie de fio condutor da obra e que se reflete também numa encenação
bastante livre e num elenco de composições dramáticas bastante pungentes. Nesse
último quesito, destaque absoluto para Matheus Nachtergaele em sensacional papel
duplo repleto de nuances, além do belo aproveitamento do cantor e compositor
Jards Macalé como ator. Aliás, o lado musical de “Big Jato” é outra extensão
criativa expressiva das particulares concepções artísticas de Assis, em que a
combinação de eletrônica e regionalismo extraída por DJ Dolores mostra sintonia
magnífica com a narrativa lírica elaborada pelo cineasta.
Num conjunto geral, “Big Jato” não é tão impressionante e mesmo
impactante quanto “A febre do rato”, a obra-prima anterior dirigida por Cláudio
Assis. Ainda assim, é uma experiência cinematográfica memorável, mostrando um
lado do cinema brasileiro que, independente da quantidade de público que
arremata, continua forjando uma linguagem artística própria e ousada.
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