terça-feira, julho 05, 2016

Paulina, de Santiago Mitre ***1/2

A narrativa em “Paulina” (2015) tem o seu desenvolvimento obedecendo a princípios dialéticos. Os primeiros momentos do filme, registrados praticamente num plano-sequência austero, mostram um conflito verbal entre a protagonista Paulina (Dolores Fonzi) e seu pai Fernando (Oscar Martinez), em que cada personagem teoriza e fundamenta seus respectivos comportamentos e ideários contrastantes, ainda que ambos pareçam alinhados a uma ideologia de esquerda. Na penúltima sequência da produção, eles voltam a duelar existencialmente, só que dessa vez entra em cena toda a dura experiência de vida da personagem principal para ilustrar um posicionamento de vida coerente e humanista, desconcertando os valores pequeno-burgueses hipócritas da figura patriarcal. Entre as duas sequências citadas, há um desenvolvimento marcado por uma rigorosa construção formal e temática. Direção de fotografia e edição obedecem a um direcionamento naturalista que não se aventura em grandes arroubos estéticos, mas que oferecem a moldura narrativa ideal que amplifica ainda mais a complexidade do roteiro, em que os preceitos mais caros de uma sociedade marcada pelo sexismo, injustiça social e repressão estatal são desconstruídos de maneira sutil e perturbadora. Num primeiro momento, as escolhas de Paulina em como proceder ética e moralmente após ter sido estuprada por um grupo de camponeses podem parecer radicais e insólitas, mas aos poucos vão revelando um sentido humano desconcertante e desafiador.

Um comentário:

Marcelo Castro Moraes disse...

Um filme que toca em assuntos delicados de hoje e que não deve ser ignorado.