A linha narrativa de “Francofonia – Louvre sob ocupação”
(2015) parece obedecer a uma lógica estética e existencial bastante particular –
é como se o espectador fosse jogado dentro de um fluxo de consciência do
diretor russo Alexander Sokurov. Tal descrição pode sugerir que o filme em
questão esteja ligado a uma mera egotrip artística, mas na verdade a obra de
Sokurov vai muito mais além disso. Trata-se de uma reflexão fílmica sobre a
guerra, a arte e os valores ocidentais em que o cineasta se vale de recursos e
referências diversos para engedrar um estilo único, algo que ele já tinha
delineado em “A arca russa” (2002) e que nesse trabalho mais recente se
consolida de forma ainda mais radical. Nessa peculiar e desconcertante
concepção formal, recriação dramática, linguagem documental, ensaio filosófico
e digressões pessoais se combinam com uma naturalidade impressionante, causando
um efeito por vezes hipnotizante na sua síntese narrativa que casa registro
histórico e encenação entre o realismo e o sutil delírio onírico. Sokurov se
vale de tais recursos não apenas como um exercício de virtuosismo e
experimentação da linguagem, mas também para aprofundar a dimensão humanista
que oferece ao retratar o período em que o museu do Louvre ficou sob o domínio
nazista durante a ocupação alemã na França durante a 2ª Guerra Mundial. O
diretor rompe com os preceitos típicos do gênero do cinema de época: mais
importante que a pretensa fidelidade histórica relativa à recriação física do
ambiente e dos indivíduos, é primordial o resgate de uma atmosfera cultural e
social da época e que se estende para a ligação intrínseca entre caracterização
psicológica de determinadas pessoas e o contexto político que as cerca. Se num
primeiro momento “Francofonia” se apresenta como um insólito exercício de
revisionismo histórico, com o seu desenrolar as soluções criativas de Sokurov
configuram uma obra que também procura e sugere respostas que para o nosso
conturbado presente.
Nenhum comentário:
Postar um comentário