O diretor Carlos Nader reforça em “A paixão de JL” (2014)
uma concepção muito particular em relação à pratica do cinema documental que já
havia ficado bastante latente em “Homem comum” (2014). Roteiro e narrativa
parecem obedecer a uma lógica espontânea e aparentemente aleatória, mas que aos
poucos vai revelando uma estranha e fascinante coerência artística e
existencial. Os elementos dramáticos e formais se entrelaçam a partir de um
método marcado por um olhar impressionista – no caso de “A paixão de JL”, essa
preponderância pelo subjetivismo fica evidente a partir da própria estrutura
narrativa da obra, em que toda a encenação se fundamenta em torno das gravações
em fitas cassetes dos depoimentos verbais do artista plástico José Leonilson,
que morreu em 1993 devido a complicações decorrentes do fato de ser portador do
HIV. A dinâmica audiovisual construída por Nader para adequar esse diário oral
dentro de uma linguagem cinematográfica é baseada em escolhas estéticas simples
e bastante eficientes. O cineasta recorre a trechos de filmes mencionados por
Leonilson em seus depoimentos, passagens documentais de eventos históricos que
contextualizam a época das gravações originais e imagens de algumas das
principais obras do biografado. Além disso, a produção se utiliza de criativas
construções imagéticas que emulam os sonhos e delírios descritos por seu
protagonista. O resultado final é um memorável épico intimista, uma espécie de
jornada dentro da mente de um indivíduo repleta de criatividade e desejos, mas
que sucumbe perante a progressiva decadência física acarretada pela AIDS. A contundente
síntese entre formalismo imaginativo, abordagem emocional à flor-da-pele e
sutil observação sócio-política coloca “A paixão de JL” como uma espécie de
gêmeo artístico do extraordinário “Elena” (2012), mostrando uma vertente no
cinema brasileiro que cada vez mais se afasta das fórmulas previsíveis e
despersonalizadas destinadas a agradar as grandes plateias, em nome de caminhos
mais contundentes e memoráveis.
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