A filmografia do diretor tailandês Apichatpong Weerasethakul
revela uma insólita coerência em suas concepções artísticas. Seus filmes se
vinculam ao gênero fantástico, mas são quase que completamente destituídos dos
clichês narrativos habituais a tais produções. De forma rara o cineasta se vale
de algum efeito especial, fazendo com que as suas histórias versando sobre
lendas e fantasmas se desenvolvam dentro de um formato naturalista, com direito
inclusive a uma encenação que evoca o documental na sua crueza de
caracterização de personagens e situações. O elemento fantástico se insere de
forma fluente, como se fosse intrínseco àquele universo. Nesse conjunto de
aparentes contrastes, resulta obras de rara beleza visual, narrativa poética e
atmosferas hipnóticas no seu minimalismo. “Cemitério do esplendor” (2015) é um
exemplar expressivo desse peculiar estilo de Weerasethakul. É provável que seja
o menos hermético de seus trabalhos – ainda assim, não há concessões na sua
abordagem que dispensa truques óbvios e baratos para contar a trama de soldados
narcolépticos que são possuídos por antigos espíritos de guerreiros. Não há a
necessidade de ambientações épicas ou reviravoltas dramáticas de roteiro. Mesmo
quando o aspecto emocional se manifesta com mais força, é sempre dentro de
limites sutis que impedem que se caia no sentimentalismo excessivo. A narrativa
flui dentro de um misto de serenidade e estranheza, prevalecendo
planos-sequência que desconcertam nas mínimas variações de nuances imagéticas. Numa
impressão geral, é como se espectador entrasse dentro de um registro cotidiano
de uma fábula ou de um sonho. Nessa síntese entre a casualidade e o fantástico
reside a grande força criativa de “Cemitério do esplendor”.
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