segunda-feira, setembro 12, 2016

Errante - Um filme de encontros, de Gustavo Spolidoro ***

Em relação ao longa-metragem anterior de Gustavo Spolidoro, “Morro do céu” (2009), o filme mais recente do diretor gaúcho, “Errante – Um filme de encontros” (2014), representa uma radicalização dentro da sua concepção no gênero documentário. Spolidoro deixa a narrativa e a câmera fluírem de acordo com seus sonhos e devaneios, além de contarem também com os acasos do destino. Não se trata de uma obra que busca a perfeição formal e mesmo uma linha temática que se mostre coerente sempre. Por vezes, tal síntese estética-existencial é incômoda, quase resvalando num aparente “amadorismo”, principalmente em seu terço inicial, quando o cineasta parece estar procurando um caminho mais definido e deixa expresso para o espectador suas inquietações e ambições para o seu filme. Numa dessas suas digressões, Spolidoro cita Jean Rouch e isso não é gratuito, pois “Errante” trafega numa bifurcação entre o documentário etnológico de Rouch e o gosto pelos depoimentos de entrevistados que variam naturalmente entre o banal e o profundo que era típico na filmografia de Eduardo Coutinho. Essa junção de influências e referências, contudo, não implica num simples pastiche de estilos alheios. Pelo contrário: há uma aura de certa originalidade que em determinado momento, de maneira sutil, envolve a plateia pela maneira como o insólito se insere dentro do cotidiano. Dentro de um “roteiro” em que convivem em bizarra harmonia na mesma trama estrangeiros radicados no Brasil ou apenas de passagem, idosos aposentados jogando conversa fora ou vagado pela cidade num rumo obscuro, um criador de marionetes, um jogador de bocha que se diz entendido em fósseis, gatos domésticos e cachorros vira-latas, o fluxo sensorial e mesmo conceitual da câmera de Spolidoro deseja se interligar com o olhar do próprio espectador ao sugerir que se esse último concentrasse a sua atenção naquilo que lhe parece corriqueiro e desimportante poderia encontrar algo de estranho e fascinante, e , quem sabe, haveria até a possibilidade de ingressar universo quase paralelo.

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