Uma das fases mais expressivas na filmografia do diretor
Roberto Rossellini foi quando ele incorporou o seu estilo naturalista que havia
depurado em suas primeiras obras no neo-realismo italiano dentro de um formato
de conto moral-metafísico. Em parceria com a sua esposa na época, Ingrid
Bergman, lançou obras memoráveis nessa particular formatação (Stromboli, Europa
51, Viagem à Itália). A produção francesa “O vale do amor” (2015) se mostra
como uma vigorosa extensão desses preceitos artísticos de Rossellini. Na maior
parte de sua duração, a narrativa se mostra vinculada a uma encenação e
ambientação de fortes tons naturalistas, em que a direção de fotografia de
enquadramentos secos e iluminação crua e a edição de poucos cortes e ritmo
austero acentuam uma atmosfera que beira o sufocante, tanto pela sensação
física de calor severo que os protagonistas interpretados por Gérard Depardieu
e Isabelle Huppert sentem por se encontrarem no escaldante Vale da Morte nos
Estados Unidos quanto pelo mal estar psicológico causado pelo suicídio do filho
de ambos. Há algo na encenação e no roteiro que evoca o documental,
principalmente pelo fato de que características das personas de Depardieu e
Huppert são incorporadas em seus personagens. Só que aos poucos alguns
elementos de cinema fantástico vão se inserindo na narrativa, fazendo com que a
atmosfera da obra trafegue ambiguamente entre uma possível desagregação mental
dos indivíduos e uma comovente hipótese de transcendência mística. O fato de “O
vale do amor” nunca deixar exatamente claro o que está acontecendo na tela
aumenta a sua aura de mistério e explicita um perturbador teor sensorial à
flor-da-pele.
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