Sou um grande apreciador da obra de Neil Gaiman, mas confesso que não li o romance ilustrado “Coraline”. Mas assistindo a versão cinematográfica dessa obra se pode sentir a aura de conto de fada doentio e perverso tão característico do universo de Gaiman. E isso é perfeitamente explicável quando vemos que nos créditos que o cineasta responsável por tal adaptação é Henry Selick, o mesmo da obra-prima da animação de stop-motion “O Estranho Mundo de Jack” (1993), filme esse que já trazia esse tom onírico e assustador de “Coraline”. Nesse último, Selick preserva a sua técnica impecável de stop-motion, além de desenvolver uma narrativa tensa e eletrizante recheada de tipos que oscilam entre o encantador e o assustador. Aliás, essa ambigüidade permeia toda a trama. O visual arrebatador e colorido que predomina no mundo de fantasia que a menina Coraline adentra também traz dentro de si um ambiente repleto de obscuridades e atos cruéis. Gaiman e Selick ousaram colocar num filme infanto-juvenil aquele que é o maior medo de uma criança ou adolescente: a perda dos pais. E no caso de Coraline, a situação ainda é pior, pois essa possibilidade pode ocorrer por um ato dela mesma. Não é a toa que na sessão em que assisti à “Coraline” não se ouvia um pio por parte da gurizada, sendo que inclusive ouvi comentários que em outras sessões do filme havia até criança chorando. Eu mesmo achei essa a produção mais assustadora que assisti nos cinemas nesses últimos dois anos, pelo menos. E essa constatação só comprova uma posição mais que saudável e corajosa de Selick em preservar a atmosfera original e sombria da literatura de Gaiman, fazendo a gente sonhar com a hipótese de uma adaptação mais que decente para a magnífica série “Sandman”, a obra máxima do referido autor inglês.
Boa parte de amigos e conhecidos costuma dizer que as minhas recomendações para filmes funcionam ao contrário: quando eu digo que o filme é bom é porque na realidade ele é uma bomba, e vice-versa. Aí a explicação para o nome do blog... A minha intenção nesse espaço é falar sobre qualquer tipo de filme: bons e ruins, novos ou antigos, blockbusters ou obscuridades. Cotações: 0 a 4 estrelas.
segunda-feira, abril 27, 2009
sexta-feira, abril 24, 2009
O Lutador, de Darren Aronofsky ****
Confesso que os dois primeiros filmes do cineasta Darren Aronofsky, “Pi” (1998) e “Réquiem Para Um Sonho” (2000) nunca me chamaram muito a atenção, fazendo com que eu achasse tal diretor um nome tremendamente superestimado. “A Fonte” (2006), bela produção de ficção científica influenciada visualmente por quadrinhos europeus, fez tal situação mudar bastante de figura. Mas é agora com “O Lutador” (2008) que Aronofsky mostra definitivamente que é um grande diretor. Ele adora um estilo seco e direto, de tons quase documentais, nessa narrativa sobre o lutador decadente Randy “Lamb” (Mickey Rourke) que se vê diante de uma encruzilhada existencial, não abrindo mão, entretanto, de utilizar brilhantemente recursos estéticos como planos seqüências e alternância de narrativa em dois tempos. Nesse sentido, são inesquecíveis seqüências como aquela em que o protagonista percorre o supermercado onde trabalha como se estivesse preste a entrar em um ringue ou quando ele luta com o grotesco Necron, em que são mostrados de forma praticamente simultânea o pós-combate, com “Lamb” examinando os seus ferimentos, e a própria luta em si, um dos momentos de brutalidade mais intensos já mostrados no cinema. Além disso, Aronofsky se afasta da solução óbvia de encarar o drama de “Lamb” como uma parábola edificante ou de redenção, oferecendo ao personagem uma densidade dramática fascinante ao retratá-lo como um indivíduo que percebe que é tarde demais para mudar de atitude perante o mundo, restando-lhe apenas agir de forma coerente com o que ele foi durante toda a sua vida
Jango, de Silvio Tendler ***1/2
Esse documentário de 2004 dirigido por Silvio Tendler focalizando a vida de João Goulart tem um tom escancaradamente panfletário e é quase didático em algumas seqüências. Essa visão mais ideológica de Tendler, entretanto, funciona a favor do filme, pois oferece vigor e paixão raros de se encontrar nesse tipo de produção. A dinâmica da narrativa, misturando preciosas imagens de arquivos com depoimentos contundentes em um trabalho fenomenal de edição, faz com que “Jango” tenha um ritmo impressionante de “thriller”. Tanto para os interessados na História do Brasil como para os simples apreciadores de cinema, “Jango” é um filme imperdível!
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