O título desse documentário dirigido por Boca Migotto é uma
bela sacada conceitual e sintetiza com perfeição o próprio espírito da obra. “Filme
sobre um Bom Fim” (2015) não se refere apenas a uma localidade física, mas
também, e principalmente, a uma gama de sensações e desejos que brotaram e se
expandiram de forma intensa nos anos 80. Ao longo da narrativa, há um número
considerável de entrevistados, cuja maioria dos depoimentos se mostra relevante
por diversos fatores. Por vezes há uma unidade nessa percepção coletiva sobre o
significado do que ocorreu naquele período. Em outros momentos, entretanto, as
declarações se mostram contraditórias, oscilando entre a profundidade histórica
e o anedótico, a amargura pragmática e a pura louvação idealista. Esse
desencontro de ideias e opiniões valida ainda mais o trabalho de Migotto, dando-lhe
uma maior dimensão humana e densidade existencial, retirando o filme daquilo poderia
parecer um vídeo institucional. Pode-se sentir raiva dos monólogos exagerados e
narcisistas de Peninha Bueno, admirar a aguda visão sociológica de Juremir
Machado Silva ou simpatizar com os causos narrados pelos donos dos bares
Ocidente e Escaler. O mais interessante, contudo, é o quadro geral formado por
essas diferentes perspectivas que parece configurar uma verdadeira dimensão
paralela que se formou dentro de uma área específica de Porto Alegre.
As escolhas formais para contar essa saga cultural podem
parecer conservadoras e convencionais, obedecendo àquela tradicional equação de
entrevistas e farto material de arquivo, mas a opção declarada de Migotto era
evidenciar a história daquele período pela ótica daqueles que ajudaram a
construir aquele cenário artístico e comportamental. Dentro dessa concepção, “Filme
sobre um Bom Fim” funciona de forma eficaz como um retrato fiel e vigoroso de
uma geração.