A história da Chess Records é bastante emblemática da
importância e influência da música negra-norte americana no século XX. Entre as
décadas de 40 e 60, a gravadora ajudou a lançar nomes fundamentais do blues
elétrico e do rock and roll (Muddy Waters, Little Walter, Etta James, Howlin’
Wolf, Chuck Berry), ajudando a tirar tais gêneros do rótulo preconceituoso de “race
music” e universalizando seu público. Ao mesmo tempo, entretanto, reproduziu
modelos de exploração econômica típicos da época – o dono da gravadora, o judeu
branco Leonard Chess (Adrien Brody), ficou com boa parte dos lucros originários
da arte de seus principais músicos negros. A complexidade dessa história e o
poder cru e selvagem das canções e interpretações de tais artistas não encontram
um tratamento de igual profundidade e interesse em “Cadillac Records” (2008). A
abordagem do diretor Darnell Martin é superficial e convencional em demasia,
com os principais eventos dramáticos da trama tendo uma encenação pouco
inspirada e digna de uma novela televisiva. Faltou maiores ousadia e traquejo
para conseguir traduzir a música sexy e violentamente rítmica dos músicos da
Chess num conjunto imagético igualmente estimulante. Para aqueles que gostam de
Waters e companhia e mesmo para outros que desconhecem esse rico acervo de sedutores
ritmos e melodias e poderosas interpretações até vale assistir a “Cadillac
Records” como um passatempo razoavelmente instrutivo e com alguns momentos
prazerosos (mais “por culpa” da matéria bruta musical, diga-se de passagem...).
No mais, o filme de Martin dá uma constante impressão de frustração.
Boa parte de amigos e conhecidos costuma dizer que as minhas recomendações para filmes funcionam ao contrário: quando eu digo que o filme é bom é porque na realidade ele é uma bomba, e vice-versa. Aí a explicação para o nome do blog... A minha intenção nesse espaço é falar sobre qualquer tipo de filme: bons e ruins, novos ou antigos, blockbusters ou obscuridades. Cotações: 0 a 4 estrelas.
quinta-feira, março 31, 2016
quarta-feira, março 30, 2016
Dois disparos, de Martin Rejtman ***1/2
Logo no começo de “Dois disparos” (2014), o jovem Mariano
(Rafael Federman) encontra um revólver por acaso ao remexer ferramentas na
garagem de sua e como se fosse por mera curiosidade atira duas vezes em si. Sem
maiores explicações, sobrevive. A partir dessa premissa, o esperado seria um
denso drama a investigar as misérias existenciais do garoto e daqueles que o
cercam que o levaram a praticar o ato tresloucado. Só que no universo do
diretor argentino Martin Rejtman o direcionamento narrativo e temático parece
obedecer a uma lógica bizarra e particular. O evento da tentativa de suicídio
de Mariano desencadeia uma sucessão de fatos aleatórios, quase desconexos, em
que o foco da trama a todo momento se desvia para caminhos estranhos e por
vezes encharcados de um humor esquizoide. As regras tradicionais de um roteiro “arredondado”
a todo momentos são subvertidas em nome de soluções criativas desconcertantes.
Além disso, Rejtman cria uma constante atmosfera de distanciamento emocional
perturbador, em que os personagens demonstram em diálogos, expressões e gestos
uma apatia irônica em suas interações sociais. Nessa conjunção de insólitos
maneirismos estéticos e narrativos resulta uma obra marcada por um extraordinário
teor surrealista e também uma corrosiva e sutil crítica aos costumes pequeno
burgueses, algo entre o ascetismo formal de Bresson e o onirismo sarcástico de
Buñuel.
terça-feira, março 29, 2016
Batman vs Superman - A origem da justiça, de Zack Snyder *1/2
Assim como em outras adaptações para as telas de obras dos
quadrinhos dirigidas por Zack Snyder, a impressão que se tem ao se assistir à “Batman
vs Superman – A origem da justiça” (2016) é a de alguém que nunca leu uma HQ na
vida, folheou apressadamente algumas histórias clássicas e emblemáticas do
gênero e socou de qualquer jeito citações e referências do material que leu
dentro de um roteiro. Por vezes, até dá para perceber algumas boas ideias
absorvidas nessa pesquisa, mas quase todas elas não são muito mal aproveitadas
e executadas. Não se trata apenas de uma questão de ter uma fidelidade ipsis
literis na transposição daquilo que está nos quadrinhos para uma produção
cinematográfica, mas simplesmente entender aquilo que torna único e carismático
toda uma série de personagens e mesmo o contexto que os envolvem, ou seja,
aquilo que os torna atraente de maneira perene por todas essas décadas de
existência. Por mais que Snyder queira dar uma aura adulta e profunda dentro de
sua abordagem pretensamente sombria e solene, a caracterização de personagens e
situações é rasteira e de pouca densidade psicológica, caindo por vezes no
francamente ridículo (nesse sentido, tudo em “Batman vs Superman” é tão
grotesco que em alguns momentos a obra consegue até ser divertida...). Dessa
forma, Batman (Ben Affleck) fica reduzido a um brutamontes impulsivo e
francamente homicida, Superman (Cavill) é destituído de carisma e Lex Luthor
(Jesse Eisenberg) é apenas um garoto debilóide e mimado. Já o roteiro é um
cozido mal ajambrado de chupações sem critérios de sagas marcantes das HQs como
“O cavaleiro das trevas” e “A morte de Superman”. Para compensar essa falta de
consistência existencial, Snyder usa e abusa de explosões e porradarias
diversas, mas tudo dirigido de forma tão genérica e despersonalizada que faz
com que praticamente nenhuma cena traga algo de memorável para o imaginário do
espectador. Do jeito que ficou, “Batman vs Superman” parece ser apenas um mero
pretexto mercadológico para que no futuro saia um filme da Liga da Justiça
(afinal, como explicar as participações estapafúrdias de Flash e Ciborgue na
trama?). Quem sabe até lá Snyder tenha uma epifania e aprenda a dirigir um
filme. Ou mesmo o estúdio tenha alguma iluminação e bote um cineasta com algum
talento para se responsabilizar pela produção.
segunda-feira, março 28, 2016
O regresso, de Alejandro González Iñarritu ***
A sequência de abertura de “O regresso” (2015) é promissora
– com edição de poucos cortes e encenação vigorosa, o diretor mexicano
Alejandro González Iñarritu concebe tomadas de ação alucinada ao retratar uma
batalha entre caçadores de pele e índios no interior selvagem dos Estados
Unidos na primeira metade do século XIX. Se Iñarritu mantivesse seu filme nessa
levada, haveria a forte possibilidade de se ter uma obra antológica no gênero
aventura. Mas para as pretensões artísticas do cineasta em questão, talvez isso
fosse muito pouco... O fato é que a narrativa do filme envereda em vários
momentos por uma atmosfera reflexiva, por vezes até caindo no metafísico. E
assim, dá-lhe tomadas com personagens olhando para o horizonte, narração em off
de texto pretensamente poético, estética new age em algumas tomadas. Essa
conjugação entre aventura de época e drama existencial não chega a ser
exatamente uma novidade, vide, por exemplo, o extraordinário “O novo mundo”
(2005). Ocorre, entretanto, que Iñarritu se mostra bem longe de atingir o
equilíbrio formal e temático que Terrence Mallick obteve em sua mencionada
obra. “O regresso” parece muito mais refletir uma espécie de indecisão criativa
de seu criador entre o faroeste naturalista casca grossa e o épico
existencialista, fazendo com que o casamento entre esses dois polos narrativo
não atinja um ponto de fluidez satisfatório. Mesmo o fato da longa duração da
produção não implica necessariamente em uma caracterização psicológica mais
aguda de personagens e situações. Nesse sentido, os momentos em que se
manifestam os delírios e devaneios oníricos do protagonista Hugh Glass
(Leonardo DiCaprio) são apenas enfadonhos e marcados por um simbolismo raso. A
verdade é que “O regresso” mostra a que veio quando Iñarritu deixa o
cerebralismo fajuto de lado e envereda em boas cenas de tiroteios, perseguições
a cavalo e brutais duelos com facas e machadinhas, chegando até a fazer lembrar
trabalhos marcantes no gênero como “O último dos moicanos” (1992) ou
“Apocalypto” (2006).
quinta-feira, março 24, 2016
American Hardcore, de Paul Rachman ***
A estrutura narrativa de “American Hardcore” (2006) é básica
como os poucos acordes que marcaram algumas das melhores canções do gênero
musical ao qual radiografa. Para contar a história da cena dessa vertente do
punk rock no período de 1980 a 1986, o diretor Paul Rachman se utilizou da
velha combinação de depoimentos dos principais envolvidos no movimento com
várias imagens de arquivos. Ok, não há grandes ousadias e inovações em tal
estética, mas o fascinante contexto histórico e cultural que é focado e a
paixão de Rachman e seus entrevistados em tratar do hardcore, assim como a
maravilhosa música que há todo momento invade a tela, tornam esse documentário
essencial e tremendamente divertido para quem tem interesse por contracultura e
rock underground em geral. O hardcore norte-americano da primeira metade dos
anos 80 foi ingrediente fundamental no rol de influências que ajudaram a
fundamentar boa parte daquilo que os Estados Unidos tiveram de melhor em seu
cenário musical nos anos seguintes até os dias de hoje, não só no aspecto
musical como também na própria formatação de um cenário de pequenas e
eficientes gravadoras independentes e um circuito de clubes e casas de shows
fora da megalomania comercial de grandes arenas e estádios. Essa combinação
entre selos e locais para tocar foi primordial para a divulgação de um produto
cultural marcado pela radicalidade e desafio às instituições e costumes
reacionários. E tudo isso numa época que marcava o renascimento com força total
do conservadorismo político, econômico, social e cultural da Era Reagan. “American
Hardcore” consegue captar essa atmosfera de conflito de maneira didática e
empolgante, compondo um mosaico complexo e instigante de uma época. Talvez haja
gente que não se interesse tanto pelo assunto em questão e ache o documentário
de Rachman dispensável, mas provavelmente é aquele tipinho que acha o Maroon 5
o máximo em termos de rock ou o hipócrita travestido de revoltado que deseja a
queda sem fundamentos legais e morais de um governo legítimo e voltado para
questões sociais.
quarta-feira, março 23, 2016
Zootopia, de Byron Howard, Rich Moore e Jared Bush ***1/2
Pelo menos em termos temáticas, as animações dos Estúdios
Disney têm se mostrado diversificadas, conforme pôde ser visto em tramas
versando sobre mitologia vodu (“A princesa e o sapo”), recriação de fábulas
clássicas (“Enrolados”), homenagem/ironia com o universo dos video games (“Detona
Ralph”), reconfigurações de princesas e príncipes (“Frozen”) e absorção de
elementos de mangás e animes (“Operação Big Boy”). E com o importante detalhe
de sempre preservar uma expressiva qualidade narrativa e estética que os coloca
junto a filmes da Pixar num patamar diferenciado no gênero. Em “Zootopia”
(2016), tanto esse padrão de qualidade quanto a escolha de uma temática
insólita permanecem de maneira expressiva. Essa nova produção apresenta uma contundente
síntese de personagens antropomorfizados, roteiro evocando elementos de cinema
noir e sutil crítica social e comportamental, e de todas as produções recentes
citadas da Disney talvez seja aquela que tenha uma abordagem mais universal na
capacidade de agradar conjuntamente crianças e adultos (e sem precisar apelar
para psicologismos de araque e autoexplicativos de “Divertida mente”). Além
disso, o grafismo de “Zootopia” é espetacular na combinação entre uma
estilização de conceituação visual “fofinha” e toques de animação realista, conseguindo
configurar uma ambientação bastante particular no seu detalhismo cênico. Toda
essa abordagem formal se mostra em fina sintonia com uma trama com ares de
sofisticação na caracterização dramática de seus principais personagens e nos
desdobres da história, especialmente em nuances de dilemas e conflitos que
evocam questões espinhosas como preconceito e determinismo social. Há também as
doses certas de sequências ação bem dirigidas e as citações culturais bem
humoradas que dão aquele caráter de narrativa envolvente para a produção.
terça-feira, março 22, 2016
Jimmy's Hall, de Ken Loach ***
Há filmes que na mão de um diretor qualquer seriam obras
medíocres e esquecíveis, mas que sob a batuta de um cineasta diferenciado
acabam ganhando uma dimensão artística bem maior. Esse é bem o caso de “Jimmy’s
Hall” (2014), produção que foca a história de um homem que volta para a sua
cidadezinha no interior da Irlanda, abre um salão de diversão e conscientização
política e desperta a ira das conservadoras autoridades do local,
principalmente de setores da igreja católica. A estrutura narrativa é
convencional e os desdobramentos do roteiro obedecem a uma ordem tradicional
dentro de um gênero misto de melodrama e crítica sócio-política. Só que quem
está por trás das câmeras é Ken Loach, para quem esse tipo de trama é quase
inerente ao seu estilo. Ainda que “Jimmy’s Hall” não represente um dos pontos
altos da carreira de Loach, estão lá aquelas habituais características formais
e temáticas tão caras ao veterano diretor britânico e que ainda se mostram
capazes de cativar o público – a envolvente fluência narrativa, a caracterização
carismática dos personagens, o roteiro enxuto e de visão ácida sobre as
autoridades opressoras, a encenação vigorosa que transcende qualquer tipo de
clichê. Dentro dessa abordagem, mesmo sequências previsíveis em suas nuances
ganham arrepiante força dramática. E em tempos conturbados como o que vivemos
tanto no Brasil como no resto do mundo, onde velhas e tenebrosas ideias
reacionárias ganham ares de novidades e vários adeptos, “Jimmy’s Hall” acaba se
mostrando ainda pertinente e desafiador na sua contundente crítica ao poder
repressor de determinadas alas da sociedade.
segunda-feira, março 21, 2016
Cemitério do esplendor, de Apichatpong Weerasethakul ***1/2
A filmografia do diretor tailandês Apichatpong Weerasethakul
revela uma insólita coerência em suas concepções artísticas. Seus filmes se
vinculam ao gênero fantástico, mas são quase que completamente destituídos dos
clichês narrativos habituais a tais produções. De forma rara o cineasta se vale
de algum efeito especial, fazendo com que as suas histórias versando sobre
lendas e fantasmas se desenvolvam dentro de um formato naturalista, com direito
inclusive a uma encenação que evoca o documental na sua crueza de
caracterização de personagens e situações. O elemento fantástico se insere de
forma fluente, como se fosse intrínseco àquele universo. Nesse conjunto de
aparentes contrastes, resulta obras de rara beleza visual, narrativa poética e
atmosferas hipnóticas no seu minimalismo. “Cemitério do esplendor” (2015) é um
exemplar expressivo desse peculiar estilo de Weerasethakul. É provável que seja
o menos hermético de seus trabalhos – ainda assim, não há concessões na sua
abordagem que dispensa truques óbvios e baratos para contar a trama de soldados
narcolépticos que são possuídos por antigos espíritos de guerreiros. Não há a
necessidade de ambientações épicas ou reviravoltas dramáticas de roteiro. Mesmo
quando o aspecto emocional se manifesta com mais força, é sempre dentro de
limites sutis que impedem que se caia no sentimentalismo excessivo. A narrativa
flui dentro de um misto de serenidade e estranheza, prevalecendo
planos-sequência que desconcertam nas mínimas variações de nuances imagéticas. Numa
impressão geral, é como se espectador entrasse dentro de um registro cotidiano
de uma fábula ou de um sonho. Nessa síntese entre a casualidade e o fantástico
reside a grande força criativa de “Cemitério do esplendor”.
sexta-feira, março 18, 2016
Operação invasão 2, de Gareth Edwards ****
Para aqueles que tem aversão por sequências, continuações e
afins, um aviso logo de cara: assistir ou não ao primeiro “Operação Invasão”
(2011) é praticamente irrelevante para se entender a trama dessa segunda parte
(o único senão é que quem não assistiu ao primeiro filme está perdendo um belo
exemplar do gênero ação/policial), pois em qualquer uma das duas produções o
roteiro não é exatamente o maior atrativo. Não que se tenha uma história ruim –
em “Operação invasão 2” (2014) a história até que é bem convincente em seus
desdobramentos e serve como um bom complemento para aquilo que realmente
interessa na obra em questão, ou seja, a narrativa alucinada e sequências de
ação dirigidas com um extremo esmero gráfico. O diretor britânico Gareth
Edwards se supera em relação ao primeiro filme no sentido de diversidade e
virtuosismo estéticos. As cenas de porradaria, perseguições e tiroteios apresentam
coreografia e encenação que beiram o surreal tanto no seu detalhismo cênico
quanto na precisão dos movimentos. A direção de fotografia capta esse frenesi
visual sem apelar para os maneirismos contemporâneos do gênero (câmera tremendo
ou fora de foco, iluminação difusa), fazendo com que posse perceber cada nuance
no desenvolvimento da ação. Contribui também para o resultado imagético explosivo
de “Operação invasão 2” o fato de ser uma produção fora do âmbito dos grandes
estúdios norte-americanos, fazendo que a violência explícita seja muito mais
acentuada e chocante. Se entre a primeira e a segunda parte houve toda essa
evolução artística, é de se até imaginar como seria algumas eventuais
continuações...
quinta-feira, março 17, 2016
Tenebre, de Dario Argento ***
É evidente que “Tenebre” (1982) é uma obra menor dentro da
filmografia do cineasta italiano Dario Argento. Depois de um período em que
enveredou na vertente do horror sobrenatural (e que rendeu trabalhos
excepcionais como “Suspiria” e “Mansão do inferno”), o cineasta voltou para os
preceitos narrativos típicos do gênero giallo que havia ajudado a consagrar em
obras-primas como “O pássaro das plumas de cristal” (1970) e “Prelúdio para
matar” (1975). Ainda que não alcance a mesma dimensão artística das obras
mencionadas, “Tenebre” tem um resultado final expressivo e memorável,
principalmente devido aos momentos em que os habituais barroquismos visuais de
Argento se afloram com mais intensidade, tanto no grafismo violento e delirante
quanto numa certa atmosfera de sordidez, o que acaba compensando uma narrativa
trôpega e irregular.
quarta-feira, março 16, 2016
É o amor, de Paul Vecchiali ***
A equação artística de “É o amor” (2015) obedece a uma
lógica muito particular do diretor francês Paul Vecchiali. Alguns elementos
básicos da narrativa até obedecem a uma concepção realista, mas aos poucos eles
se desvanecem em nome de uma encenação entre o delirante e o estilizado ao
extremo. Literatura e teatro se incorporam dentro desse insólito método com uma
estranha naturalidade, fazendo com que por vezes uma mesma ação seja
reinterpretada para enfatizar um subjetivismo poético e exasperado. Dentro de
tais concepções, a obra de Vecchiali evoca referências cinematográficas
passadistas, que nos últimos tempos até pareciam um tanto distantes, como
coreografias desajeitadas que lembram velhos musicais, uma aura sombria e
melancólica que se associam a filmes de horror psicológico de algumas décadas
atrás, trejeitos formais típicos da Nouvelle Vague. Esse caldo de influências
acentua uma ambígua visão estética e temática, em que uma atmosfera de
exagerado romantismo convive com uma ótica bastante amarga sobre as relações
amorosas. Para embarcar nessa viagem sensorial de “É o amor”, o espectador tem
de se desgarrar um pouco de clichês e fórmulas usuais, mas por vezes essa
experiência pode ser gratificante diante da sensibilidade e criatividade à
flor-da-pele de Vecchiali.
terça-feira, março 15, 2016
Labirinto de mentiras, de Giulio Ricciarelli *
Recentemente, o cineasta britânico Peter Greenaway deu uma
declaração bem contundente sobre o atual estado criativo do cinema: “o cinema
está exausto de si”. Por mais que tal afirmação possa ser polêmica ou
discutível, ao se assistir a uma obra como “Labirinto de mentiras” (2014) dá
para entender o desencanto de Greenaway, pois o filme em questão do diretor
Giulio Ricciarelli é de uma irrelevância artística espantosa. Clichês
narrativos são jogados em cena de forma nada imaginativa – não há uma única
sequência que sugira alguma transcendência estética ou mesmo temática. A
encenação é engessada e artificial em excesso, faltando profundidade e alguma
verdade na caracterização de situações e personagens. O fato da temática se
relacionar ao Holocausto é usado como uma espécie de carta branca para
Ricciarelli a lhe dar uma pretensa legitimidade para não ousar um milímetro
sequer no seu formalismo dolorosamente óbvio. Na cabeça do diretor, é provável
que passe a ideia de que em produções sobre a 2ª Guerra Mundial não é possível
injetar vigor e criatividade, devendo prevalecer uma equivocada e hipócrita
abordagem solene e maniqueísta sobre os fatos históricos. A precisa ação
alucinada de “O resgate do soldado Ryan” (1998), a ironia perversa de “Bastardos
inglórios” (2009) e mesmo o elegante humanismo de “Diplomacia” (2014) são
desmentidos enfáticos das concepções conformistas e medíocres de “Labirinto de
mentiras”.
segunda-feira, março 14, 2016
O abraço da serpente, de Ciro Guerra ***1/2
O protagonista efetivo de “O abraço da serpente” (2015) é o
índio Karakamate, com a trama do filme mostrando tal personagem em dois
momentos distintos de sua vida. Assim, a real perspectiva do que se vê em tela
é de tal indivíduo. Ocorre que essa ótica particular também acaba se refletindo
na própria narrativa da obra, em um sentido que a lógica indígena altera alguns
dos elementos tradicionais da linguagem cinematográfica, principalmente no que
diz respeito ao gênero aventura. A evolução do roteiro até obedece a alguns
limites conhecidos, em que o desenrolar dos fatos implica numa evolução que
esclarece as motivações obscuras dos personagens e situações da história. O que
diferencia, entretanto, é que a dinâmica narrativa se torna mais reflexiva,
ligada a simbologia e metáforas fascinantes em seus significados e
profundidade. O formalismo concebido pelo diretor colombiano Ciro Guerra está
em forte sintonia com essa visão existencial, fazendo com que os elementos
estéticos se combinem com notável coerência – a fotografia em preto e branco
remete a uma atmosfera de mistério, a edição precisa e serena evoca um ambiente
de conto atemporal, a trilha sonora é econômica e marcante ao sublinhar as
cenas com temas que entrelaçam regionalismo e leves dissonâncias. Mesmo o ponto
nevrálgico da temática da trama, o conflito entre valores ocidentais contra o
ideário indígena e a força da natureza, encontra algo de inusitado, pois ao
invés daquele retrato de uma floresta amazônica como um inferno verde para o
homem branco, o que se tem é um meio em desequilíbrio pela inserção dos valores
cristãos-capitalistas dentro de um ambiente marcado pela relação simbiótica
entre humanidade e natureza. São nessas pontuais e sutis transgressões
artísticas que “O abraço da serpente” se mostra como um trabalho instigante e
memorável.
sexta-feira, março 11, 2016
A bruxa, de Robert Eggers ****
Se a “Corrente do mal” (2014) fez uma espécie de recriação
radical dos clichês do horror moderno, “A bruxa” (2015) vai ainda mais fundo em
suas intenções artísticas – a obra dirigida pelo norte-americano Robert Eggers
é alienígena em relação a quase todos os preceitos contemporâneos do gênero em
questão. Pega-se conceitos básicos como a existência de entidades e criaturas
maléficas e sobrenaturais, uma floresta sombria, vítimas isoladas em um lugar
ermo, algumas sequências sangrentas. Tais elementos, entretanto, são apenas o
ponto de partida para a construção de um conto gótico mais propenso a desfiar
uma simbologia complexa e fascinante do que a instigar sustos fáceis no
público. A própria parte estética já diz muito dessa abordagem da produção, em
nuances diferenciadas como a fotografia de tons esmaecidos, a direção de arte
na sua síntese de rigor e ascetismo visuais, a edição de poucos e elegantes
cortes. A encenação criada por Eggers é extraordinária em termos de atmosfera e
caracterização de situações e personagens, combinando solenidade irônica e sutilezas
psicológicas. Com o desenvolvimento da trama, o padrão tradicional de “luta do
bem contra o mal” vai se esvanecendo em nome de um retrato atávico da relação
conflituosa do homem com a natureza e também de uma sarcástica visão crítica
sobre o patriarcalismo e a repressão religiosa. Nesse contexto, o verdadeiro
horror não está nas ações da bruxa do título ou na conspiração silenciosa dos
animais, mas sim no enlouquecido fundamentalismo cristão familiar que oprime a
jovem Thomasin (Anya Taylor Joy). Dentro dessa lógica, a história avança de
forma inexorável e com uma desconcertante coerência existencial. Nesse sentido,
por exemplo, é antológica a sequência em que o garoto Caleb (Harvey Scrimshaw),
um pobre coitado cheio de desejos incestuosos para com Thomasin, se embrenha na
floresta e acaba aos pés de uma belíssima feiticeira nua que o beija. E em sua
conclusão, no diálogo entre Thomasin e o melífluo Black Phillip (o bode mais
carismático da história recente do cinema) e na sua literal e dionisíaca
ascensão, “A bruxa” se configura em definitivo como uma das obras mais libertárias
a surgir nas telas nos últimos anos.
quinta-feira, março 10, 2016
Tangerine, de Sean Baker ***
Alguns aspectos insólitos da concepção de “Tangerine” (2015)
têm feito com que essa produção norte-americana dirigida por Sean Baker seja
mais encarada como uma curiosidade do que uma obra efetivamente instigante.
Comenta-se bastante o fato de ser protagonizado por dois travestis, fala-se
também da questão de ter sido filmada com aparelhos iPhones. Ocorre,
entretanto, que o filme acaba transcendendo o status de mera excentricidade por
méritos artísticos bem contundentes. As escolhas formais e temáticas acima
mencionadas não se revelam gratuitas e se integram com naturalidade dentro de
uma proposta muito bem definida por parte de Baker. As tomadas gravadas por
celulares podem por vezes dar um caráter rústico para a produção, mas aos
poucos o olhar do espectador vai se acostumando com essa plasticidade crua e
que dá à narrativa uma atmosfera que alterna com sensibilidade entre o sórdido
e o encantamento. A forma com que tal direção de fotografia “suja” e compacta
se casa com uma trilha sonora de temas dançantes e eletrônicos frenéticos
oferece uma ambientação perturbadora e cativante, dando uma cara genuína e
crível para a encenação vigorosa tramada por Baker. Nesse sentido, o desempenho
dos travestis Kitana Kiki Rodriguez e Mya Taylor nos papéis principais são
marcantes nas variações entre o histrionismo e a sutileza dramática e
complementam com notável coerência a própria formatação estética e existencial
de “Tangerine”, algo como uma tradicional comédia de erros recriada sob uma
ótica pós-moderna a refletir um fascinante mundo em desiquilíbrio.
quarta-feira, março 09, 2016
A floresta de Jonathas, de Sergio Andrade **1/2
Retratar a floresta amazônica como um personagem próprio e
também como uma espécie de impenetrável inferno verde não é das tarefas mais
fáceis. Boa parte dos cineastas que tentou essa abordagem acabou se dando mal.
Hector Babenco conseguiu um resultado memorável dentro desse intento artístico
no extraordinário “Brincando nos campos do senhor” (1991). “A floresta de
Jonathas” (2012) até mostra algumas concepções interessantes, assim como
algumas sequências expressivas em termos imagético e de atmosfera. O diretor
Sergio Andrade procurou criar uma narrativa rarefeita, com encenação e edição
remetendo a um tom mais reflexivo, além de roteiro trazer uma forte carga de
simbologias em seus desdobramentos. A direção fotografia conseguiu em algumas
cenas captar com sensibilidade a beleza entre o assustador e o deslumbrante dos
cenários verdejantes do interior da Amazônia. Se nesses detalhes estéticos a
produção de Andrade consegue mostrar lampejos de criatividade, por outro lado
falta para o cineasta uma condução narrativa mais rigorosa e capaz de envolver
o espectador com mais constância, coisa que, por exemplo, o referido trabalho
dirigido por Babenco tinha de sobra.
terça-feira, março 08, 2016
A paixão de JL, de Carlos Nader ***1/2
O diretor Carlos Nader reforça em “A paixão de JL” (2014)
uma concepção muito particular em relação à pratica do cinema documental que já
havia ficado bastante latente em “Homem comum” (2014). Roteiro e narrativa
parecem obedecer a uma lógica espontânea e aparentemente aleatória, mas que aos
poucos vai revelando uma estranha e fascinante coerência artística e
existencial. Os elementos dramáticos e formais se entrelaçam a partir de um
método marcado por um olhar impressionista – no caso de “A paixão de JL”, essa
preponderância pelo subjetivismo fica evidente a partir da própria estrutura
narrativa da obra, em que toda a encenação se fundamenta em torno das gravações
em fitas cassetes dos depoimentos verbais do artista plástico José Leonilson,
que morreu em 1993 devido a complicações decorrentes do fato de ser portador do
HIV. A dinâmica audiovisual construída por Nader para adequar esse diário oral
dentro de uma linguagem cinematográfica é baseada em escolhas estéticas simples
e bastante eficientes. O cineasta recorre a trechos de filmes mencionados por
Leonilson em seus depoimentos, passagens documentais de eventos históricos que
contextualizam a época das gravações originais e imagens de algumas das
principais obras do biografado. Além disso, a produção se utiliza de criativas
construções imagéticas que emulam os sonhos e delírios descritos por seu
protagonista. O resultado final é um memorável épico intimista, uma espécie de
jornada dentro da mente de um indivíduo repleta de criatividade e desejos, mas
que sucumbe perante a progressiva decadência física acarretada pela AIDS. A contundente
síntese entre formalismo imaginativo, abordagem emocional à flor-da-pele e
sutil observação sócio-política coloca “A paixão de JL” como uma espécie de
gêmeo artístico do extraordinário “Elena” (2012), mostrando uma vertente no
cinema brasileiro que cada vez mais se afasta das fórmulas previsíveis e
despersonalizadas destinadas a agradar as grandes plateias, em nome de caminhos
mais contundentes e memoráveis.
segunda-feira, março 07, 2016
Ela volta na quinta, de André Novais de Oliveira ***1/2
Nos últimos anos, há uma vertente no cinema brasileiro que
enveredou por caminhos artísticos mais ousados e radicais tanto na concepção
quanto na sua execução. Esse radicalismo não estaria concentrado
necessariamente no hermetismo da narrativa, mas sim na utilização de meios e
recursos que fogem daqueles que normalmente são usados na grande maioria das produções.
“Ela volta na quinta” (2014) é um reflexo dessa tendência forte em algumas
obras nacionais. O diretor André Novais de Oliveira criou uma trama baseado em
experiências cotidianas, em que os desdobres do roteiro obedecem a uma lógica
natural e de caráter humanista. Dentro desse espírito temático, suas escolhas
formais revelam uma desconcertante e notável coerência. Tendo parentes, amigos
e conhecidos como intérpretes de seu pequeno drama familiar, Novais de Oliveira
cria um conto moral repleto de expressiva carga simbólica. Mesmo que seus
atores sejam amadores, ele consegue criar uma encenação cativante através de
pequenos gestos, diálogos prosaicos e expressões que se alternam entre a
melancolia e a resignação. O cineasta tem notável senso imagético – a direção
de fotografia apresenta uma eficiente combinação entre simplicidade e requinte
visuais, principalmente em seus expressivos planos-sequência fixos.
Há um momento muito revelador das intenções estéticas do
diretor em “Ela volta na quinta”, que é a sequência em que os irmãos André e
Renato Novais de Oliveira ficam assistindo a montagens de vídeos no Youtube, em
que o primeiro disseca alguns truques de edição e mostra os resultados cômicos
para o irmão. É como se o cineasta deixasse claro um dos principais fundamentos
artísticos do seu filme, que é o de incorporar à encenação trechos documentais
e mesmo o reaproveitamento de temas musicais já existentes. Esse jeito
guerrilheiro de fazer cinema cria uma atmosfera visceral e cativante para o
espectador, tornando-o ainda mais cúmplice de uma história que dispensa
apelações emocionais e simplesmente investe na crueza e na verdade das
sensações e sentimentos humanos.
quinta-feira, março 03, 2016
Cinco graças, de Deniz Gamze Ergüven ***1/2
Seria muito fácil enquadrar “Cinco graças” (2015) naquele
escaninho de obras a retratar o difícil cotidiano das mulheres em países
dominados pelo fundamentalismo religioso islâmico. Tal vertente praticamente se
tornou um gênero em si nos últimos anos, e em boa parte dessas produções o
valor político e social é bem mais preponderante do que o valor artístico
delas. Ocorre que a obra da diretora Deniz Gamze Ergüven tem uma abrangência
bem mais ampla do que esse reducionismo. Para começar, trata-se de um filme de
admirável acabamento estético e narrativo. Os planos iniciais logo de cara já
mostram que se trata de um trabalho diferenciado – é uma encenação sedutora,
enfatizando muito o aspecto sensorial, principalmente na questão com que lida
com a sensibilidade feminina diante de uma situação de repressão moral. Nesse
sentido, a sequência em que as cinco irmãs tomam banho no mar e brincam com
alguns garotos é antológica na sua fluência e carga simbólica imagética, em que
nenhum momento se nega a sensualidade inerente delas em nome de uma “inocência”
maniqueísta. Pelo contrário: é uma visão bastante desafiadora ao enfatizar o
direito de exercer a sua sexualidade da maneira como bem entender. Talvez o
aspecto mais fascinante da abordagem de Ergüven é justamente como ela faz
conciliar com naturalidade e de maneira intrínseca essa visão conceitual de
mundo com um formalismo sofisticado repleto de nuances estéticas (ainda que por
vezes o roteiro tenha algumas concessões previsíveis), fazendo com que “Cinco
graças” tenha um alcance universal muito maior que a simples crítica ao
fundamentalismo islâmico. Na verdade, é um contundente libelo pela liberdade
comportamental diante de qualquer ortodoxia religiosa, independente de ser de
matiz oriental ou ocidental.
quarta-feira, março 02, 2016
A vizinhança do tigre, de Affonso Uchoa ****
É provável que ainda por um bom tempo uma obra como “A
vizinhança do tigre” (2014) cause controvérsia pela sua natureza artística, a
exemplo de filmes como “Serras da desordem” (2006) e “Castanha” (2014). Na
realidade, a estrutura narrativa de tais produções é até simples – a partir de
experiências reais de determinados indivíduos, cria-se uma história que é
encenada por essas mesmas pessoas, com alguns maneirismos estéticos remetendo a
influências de cinema documental. Diante do resultado final, críticos, teóricos
e público acabam se questionando se aquilo é documentário, ficção ou algum
híbrido. No final das contas, entretanto, tal discussão acaba até mostrando
estéril, pois o que realmente importa é o fato de como tais trabalhos são
capazes de envolver a plateia. E nesse sentido, o filme do diretor Affonso
Uchoa é um tremendo trunfo artístico. Ao retratar parte do cotidiano de garotos
da periferia da cidade mineira de Contagem, o cineasta mostra um universo
ambíguo, entre o fascinante e o assustador. A trama que surge nas telas vai se
formando ao natural, como se por instinto, sem apelações forçadas de
sentimentalismo. Para Uchoa, importa muito mais captar determinadas atmosferas
e sensações do que amarrar pontas de um roteiro. Assim, valoriza-se a dinâmica entre
os personagens de brincadeiras, conversas, cantorias, caminhadas pela noite,
bicos de trabalhos, drogas (a sequência em que Menor fuma crack em casa é
antológica na sua ambientação de paranoia e melancolia). A encenação é
extraordinária na sua naturalidade e fluência, com Uchoa extraindo desempenhos
expressivos de seus garotos atores. Aliado a isso, há um rigor estético notável
em termos de direção de fotografia, com belíssimos planos que tanto realçam a
lúgubre paisagem urbana quanto um insólito bucolismo de matos e árvores. Enquanto
Guilherme Fontes desperdiçou uma rica infraestrutura de produção pela sua
incompetência narrativa em “Chatô” (2015), Uchoa mostra em “A vizinhança do
tigre” uma forte criatividade e domínio formal no uso de uma gama de recursos
materiais bem menor, criando um cinematográfico conto humano complexo e
poético.
terça-feira, março 01, 2016
Chatô, de Guilherme Fontes 1/2 (meia estrela)
O que vai se fazer na presente resenha não é um exercício
jornalístico, procurando informar fatos sobre “Chatô” (2015), mas sim a
impressão sensorial daquele que escreve sobre o filme. Dito isso, a percepção
que se tem após o final da produção é que o diretor Guilherme Fontes havia
elaborado inicialmente uma narrativa linear e tradicional a expor os principais
eventos da vida de seu biografado, Assis Chateaubriand, dono de um dos maiores
impérios de imprensa da história do Brasil e figura extremamente polêmica na
trajetória política do país. Ao constatar a fragilidade formal de sua obra,
Fontes inseriu sequências entre o onírico e o delirante, remetendo bastante ao
clássico musical “O show deve continuar” (1979). Ocorre, entretanto, que Fontes
não é Bob Fosse e o resultado final de “Chatô” é uma deplorável mixórdia
estética e temática. A pretensa formatação farsesca parece mais uma desculpa
para a incapacidade do diretor em obter dinâmica narrativa e concepção visual
aceitáveis. Tudo dá errado no filme: encenação truncada beirando o amador, direção
de arte qualquer nota, fotografia sem qualquer rigor imagético, elenco de
interpretações que oscilam entre o over irritante e o piloto automático, edição
desengonçada, roteiro que simplifica banalmente complexas situações históricas
e reduz importantes personagens a caricaturas. Ou seja, não é prazeroso ou
mesmo inquietante assistir à produção, e nem como registro histórico relevante “Chatô”
se presta. O desastre do conjunto artístico geral faz entender por quê Fontes
demorou tanto para lançar tal trabalho – estava com vergonha do abacaxi que
tinha em mãos. No final das contas, o melhor mesmo é ficar com a sensacional
biografia de Chateaubriand escrita por Fernando Morais, essa sim uma obra memorável
sobre a figura em questão.
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