quarta-feira, junho 30, 2010

Vidas Que Se Cruzam, de Guillermo Arriaga **

O que de início parecia um estilo vigoroso e original acabou se tornando um exercício narrativo formulaico e frouxo. É o que vem a mente quando se pensa na trajetória artística de Guillermo Arriaga, ainda mais depois de assistir a esse “Vidas Que Se Cruzam” (2008). O truque de narrar histórias paralelas, de difícil conexão aparente, que se entrecruzam e adquirem um sentido único surgiu de forma explosiva em “Amores Brutos” (2000), dirigido por Alejandro González Iñárritu. As produções seguintes da parceria Inárritu/Arriaga, entretanto, não causaram o mesmo impacto: “21 Gramas” (2003) e “Babel” (2006) aparentaram uma excessiva diluição no padrão formal e temático. Arriaga voltou a acertar a mão no ótimo “Três Enterros” (2005), mas a verdade é que os méritos do filme se concentram muito mais na direção segura de Tommy Lee Jones do que propriamente no roteiro. Assim, “Vidas Que Se Cruzam”, a estreia de Arriaga na direção, poderia marcar alguma renovação, mas não é o que acontece. A condução da narrativa é arrastada e pouco fluente e a trama arquitetada por Arriaga traz manjados dilemas já explorados anteriormente. De certa forma, é até irritante ver algumas tiradas moralistas disfarçadas de crises existenciais. Ou o que se pode achar da caracterização sórdida de uma personagem que faz sexo casual com frequência porque teve alguns graves traumas infantis?

terça-feira, junho 29, 2010

Não Minha Filha, Você Não Irá Dançar, de Christophe Honoré ***1/2


Mesmo não apresentando aquela linguagem cinematográfica mais ousada de obras como “Em Paris” (2006) e “Canções de Amor” (2007), Christophe Honoré volta a demonstrar inquietações criativas em “Não Minha Filha, Você Não Irá Dançar” (2009). A narrativa nessa produção mais recente pende para o linear, mas essa opção não implica necessariamente em acomodação. Há indícios de fragmentação no roteiro, indo de uma narração em off que beira o literário até flashbacks que irrompem sem o menor aviso. Diálogos e situações se sucedem de forma casual, dentro de um estilo que pressupõe um certo ar de improviso. Por fim, entretanto, tais opções estéticas se revelam não tão aleatórias, mostrando-se em sintonia com a trama do filme. A desagregação psíquica da protagonista Lena (Chiara Mastroiani) fica ainda pungente ao ser retratada pelas rigorosas e pouco óbvias escolhas formais de Honoré.

sexta-feira, junho 25, 2010

Guerra ao Terror, de Kathryn Bigelow ****


Na abertura de “Guerra ao Terror” (2008), a diretora Kathryn Bigelow trabalha com a ação cinematográfica da maneira mais esmiuçada: com o ritmo lento e valorizando a tensão psicológica, explora uma situação limite até chegar ao ápice da sequência da explosão de uma bomba. Nesse instante, Bigelow utiliza com precisão o recurso da câmera lenta, fazendo uma espécie de releitura/homenagem de um dos truques favoritos do mestre Sam Peckimpah. Essas cenas iniciais do filme nortearão o restante da obra, como se explicassem o suspense que está por vir.

Se nesses instantes da abertura Bigelow faz uma dissecação da ação, posteriormente ela fará com que as explosões sejam rápidas e brutais, experimentando com os limites do gênero dos filmes de guerra. O registro visual que faz da violência é ambíguo: em alguns momentos é naturalista e desglamorizado, em outros valoriza aspectos que beiram o épico e grandioso (principalmente pela extraordinária manipulação da trilha sonora). Além disso, a pretensão da cineasta na sua abordagem sobre a guerra no Iraque não é exatamente a de fazer um comentário político ou social sobre o conflito. Na realidade, sua abordagem tem uma linha mais intimista, no sentido que focaliza primordialmente a figura do Sargento James (Jeremy Renner) e a sua relação com uma realidade caótica. James vê a guerra quase como uma oportunidade de completude existencial, como se sua paz espiritual necessitasse do conflito bélico. Esse tipo de visão não chega a ser uma novidade (quem não lembra do Capitão Willard em “Apocalipse Now”?), mas Bigelow explora com louvor as possibilidades desse argumento.

quarta-feira, junho 23, 2010

Utopia e Barbárie, de Silvio Tendler ***


Os mais ranhetas podem achar que “Utopia e Barbárie” (2009) seja panfletário e esquerdista em excesso ao pretender mostrar em duas horas a história mundial dos últimos 50 anos sob uma ótica evidentemente socialista. Mas quem disse que Silvio Tendler tinha obrigação de ser imparcial? Apesar do seu documentário não esconder sua simpatia pela causa das esquerdas, o olhar do cineasta sempre pende para o humanismo. Mais que procurar um viés meramente didático e impessoal, Tendler faz um balanço de fatos e idéias marcado pela pessoalidade e emoção, dando a impressão de ter feito um correspondente cinematográfico da obra literária “A Era dos Extremos” de Eric Hobsbawn. Concentrar-se somente no aspecto temático do filme, entretanto, acabaria sendo muito reducionista. Tendler tem o inegável mérito de condensar com precisão uma gama imensa de imagens, indo de importantes registros históricos até depoimentos reveladores de figuras relevantes no campo do pensamento e da ação. Por vezes, o excesso de informações e pensamentos pode cansar o expectador, mas o que predomina é uma narrativa vigorosa e densa.

terça-feira, junho 22, 2010

Soul Kitchen, de Fatih Akin ****


Depois de obras densas em termos dramáticos como “Contra Parede” (20040) e “Do Outro Lado” (2007), o diretor alemão Fatih Akin inverte as expectativas e parte para o gênero da comédia. O que poderia soar como uma espécie de concessão comercial, entretanto, revela-se um trabalho ainda mais audacioso do cineasta.

O roteiro de “Soul Kitchen” (2009) é quase pueril nas situações, conflitos e soluções apresentados, com direito, inclusive, a um final feliz romântico. Por trás dessa aparente leveza, todavia, Akin envenena o seu filme com doses generosas de sexo, drogas e rock and roll (e funk, soul, música étnica, reggae e o que mais der na veneta). E por falar em música, a trilha sonora de “Soul Kitchen” é, praticamente, um personagem à parte. O pique alucinado e sensual das canções que predominam durante todo o filme ditam o próprio ritmo narrativo da produção, em uma mágica combinação de sons e imagens, com destaque para as seqüências de festas e danças, registradas com o devido espírito apaixonado e hedonista. E reforçando o destaque sobre a trilha sonora, vale mencionar que se tem aqui a melhor seleção cancioneira cinematográfica apresentada desde “Jackie Brown” (1997).

Os experimentos estéticos de Akin em “Soul Kitchen” são inusitados e de resultados deslumbrantes. Nunca a câmera em seus filmes foi tão dinâmica, com enquadramentos que emulam as sensações físicas e emocionais dos personagens. O fato do protagonista Zino (Adam Bousdoukos) passar boa parte do tempo com um problema na coluna, por exemplo, faz com que se veja as cenas, em alguns momentos, sob uma perspectiva “torta”. O efeito é desconcertante. Akin também incorpora influências diversas, de comédia pastelão até blackexploitation (evidentes em exagerados closes nos rostos dos personagens), condensando essas diversas referências em uma obra de coerência formal impressionante.

Junto com os franceses “Inimigo Público nº 1 – Risco de Morte” e “Entre Os Muros da Escola” (ambos de 2008), “Soul Kitchen” representa uma tendência renovadora no atual cinema europeu em apresentar obras mais estimulantes em termos estéticos e temáticos, ao invés da simples reciclagem dos padrões do cinema de bom gosto.

segunda-feira, junho 21, 2010

As Melhores Coisas do Mundo, de Laís Bodanzky **1/2


O que incomoda em “As Melhores Coisas do Mundo” (2010) é o tom de didatismo e deslumbramento que permeia o filme. O roteiro parece querer explicar como são os costumes e conflitos dos adolescentes classe média contemporâneos, em um olha misto de pai coruja com pesquisador do National Geographic. O resultado acaba sendo uma visão que beira a idealização, com personagens e conflitos estereotipados. Por mais que se abordem questões polêmicas (homossexualismo, preconceito, iniciação sexual com prostitutas, suicídio), a trama acaba se afunilando para uma estrutura típica de comédia romântica, principalmente por aquela velha e batida equação “garoto e garota amigos se amam, mas não percebem e depois de alguns percalços ficam juntos”. Parece até aquelas velhas produções anos 80 de John Hughes, mas sem o mesmo charme e bom humor. Não há como não destacar, entretanto, a boa dinâmica narrativa que Laíz Bodansky obtém em algumas seqüências – nesses momentos, a diretora parece estar em uma certa sintonia espiritual com a alma juvenil que pretendia retratar no seu filme.

sexta-feira, junho 18, 2010

Mary & Max, de Adam Elliot ***


A técnica de animação em stop motion em “Mary & Max” (2009) dificilmente se encaixa no padrão das mais inovadoras ou rebuscadas. Mesmo assim, ela se revela adequada e expressiva para a trama focada no filme ao trazer em si uma carga que tanto pode remeter a uma fábula quanto a um drama pesado sobre loucura e depressão. Essa mistura de gêneros pode parecer meio esquisita, mas adquire um estranho e coerente sentido com o desenrolar dos eventos. Também é desconcertante ver seres humanos de feições caricaturais e cômicas vivenciarem situações tão cruas e complexas (homossexualismo, alcoolismo, carência afetiva, solidão). É nessa contradição na utilização de recursos dramáticos e formais que reside boa parte do encanto de “Mary & Max”. Baseado em fatos reais, o roteiro não tem como buscar soluções fáceis e lições de vida para os seus personagens e isso nem se mostra necessário. Mesmo derrapando no sentimentalismo em algumas seqüências, “Mary & Max” é uma produção mais do que contundente.

quinta-feira, junho 17, 2010

A Estrada, de John Hilcoat ****


Se em “A Proposta” (2005) o diretor John Hilcoat havia recriado com brilhantismo os preceitos do gênero faroeste em pleno deserto australiano, em “A Estrada” (2010) ele oferece uma nova perspectiva para as produções futuristas apocalípticas. O filme traz boa parte daqueles elementos típicos para obras do estilo: visual dominado por ruínas e pela aridez, a luta pela sobrevivência diante a escassez de alimentos e infra-estrutura, grupos de indivíduos que se rendem à barbárie e, por fim, a busca pela esperança da reconstrução da civilização. O que diferencia “A Estrada” é a forma com que Hillcoat combina uma abordagem reflexiva, que beira o existencialismo, com um extraordinário domínio da ação cinematográfica. Os protagonistas, pai e filho (Viggo Mortensen e Kodi Smit-McPhee) que percorrem uma estrada aparentemente interminável à procura de segurança, envolvem-se em diversas situações que colocam em cheque a sua moral (e, por consequência, uma série de princípios humanistas), sem que, entretanto, Hillcoat abdique de encenar seqüências de aventura com uma crueza notável. Os dilemas éticos dos personagens atingem situações limites que geram cenas que impressionam pela tensão psicológica. Nesse sentido, o momento em que o pai castiga com crueldade perturbadora um ladrão negro que havia tentado roubar-lhe o seu material de sobrevivência é antológica pela sensação de desconforto que provoca no expectador.

No mais, a sombria fotografia em tons cinzas, a sóbria utilização de efeitos especiais e a melancólica trilha sonora composta por Nick Cave e Warren Ellis complementam com perfeição a atmosfera opressiva de “A Estrada”, obra que reflete um cinema vigoroso e sem concessões, mesmo que realizado dentro dos padrões de Hollywood.

quarta-feira, junho 16, 2010

Zona Verde, de Paul Greengrass **1/2


Na filmografia de Paul Greengrass, pode-se obrar uma certa unidade no padrão estético de suas produções. O cineasta procura manter um estilo bastante influenciado pelo cinema documental, abusando de recursos como a imagem granulada, câmera tremida, dando aquela impressão de uma atribulada filmagem de um noticiário. Dentro desse padrão formal, Greengrass até atingiu bons momentos como em “Domingo Sangrento” (2002) e “Supremacia Bourne” (2004). Essa fórmula se mostrou desgastada no enfadonho “Vôo 93” (2006), uma reconstituição árida e sem inspiração do único dos atentados terroristas que deu errado no 11 de setembro de 2001. Em “Zona Verde” (2010), o diretor continua focando episódios inspirados na realidade – no presente caso, a ocupação norte-americana no Iraque. Mesmo não sendo tão aborrecido quanto “Vôo 93”, o filme mais recente de Greengrass revela o esgotamento criativo do diretor. A trama se concentra em uma previsível teoria conspiratória, e mesmo como filme de aventura “Zona Verde” é insatisfatório: é tudo tão rápido e tremido que se tem a impressão de nunca se estar assistindo ao que interessa nas tomadas em que a ação prevalece.

terça-feira, junho 15, 2010

Os Homens Que Encaravam Cabras, de Grant Heslov ***


Depois dos apenas medianos “Syriana” (2005) e “Conduta de Risco” (2007), George Clooney continua investindo em produções com um viés pretensamente político, como atesta esse “Os Homens Que Encaravam Cabras” (2009). Assim como nas produções mencionadas, a pretensão de realizar uma contundente crítica aos mecanismos de poder dos Estados Unidos acaba esbarrando em uma abordagem superficial e em uma narrativa convencional. Mesmo assim, “Os Homens Que Encaravam Cabras” se mostra uma experiência cinematográfica bem mais satisfatória que os filmes citados, principalmente pelo seu tom irônico. O diretor Gran Heslov demonstra certa habilidade ao expor uma trama que oscila entre a realidade e a farsa, além de fazer uma bela gozação tanto do militarismo quanto de alguns preceitos hippies (apesar do filme, no final das contas, ser simpático à causa flower power). No mais, vale mencionar a atuação de Jeff Bridges, que parece homenagear alguns trejeitos de um dos mais carismáticos personagens que já interpretou, o doidão boa-praça The Dude de “O Grande Lebowski” (1998).

segunda-feira, junho 14, 2010

Rita Cadillac - A Lady do Povo, de Toni Venturi **


Confesso que as expectativas que eu tinha para “Rita Cadillac – A Lady do Povo” (2007) eram muito altas. Primeiro devido ao recente “Alô Alô Terezinha” (2009), ótima produção que biografava o apresentador Chacrinha e trazia Rita em uma marcante participação. E segundo pelo fato de que o diretor responsável seria o Toni Venturi, o mesmo do eficiente “Dia de Festa” (2006). O resultado, entretanto, é frustrante. O grande barato de “Alô Alô Terezinha” era sua abordagem sarcástica que não se intimidava em revelar as “bagacerias” que rondavam a figura do Velho Guerreiro e os bastidores dos seus programas, mantendo um espírito de irreverência e bandalheira tão caro ao seu protagonista. Já a produção de Venturi adota uma postura que beira o reverencial, tamanho o foco bem comportado no qual enquadra Cadillac. Privilegia-se em demasia os depoimentos recheados de lugares comuns da biografada. O filme ganha em dinâmica e vivacidade por algumas imagens de arquivos fascinantes, como os registros de apresentações de Cadillac na Serra Pelada ou no Carandiru e de cenas de algumas produções cinematográficas das quais ela participou, além de algumas colocações realmente relevantes por parte de gente como Hector Babenco. De resto, entretanto, prevalece um tom burocrático e de vídeo institucional.

sexta-feira, junho 11, 2010

Uma Noite Fora de Série, de Shawn Levy **1/2


Talvez nas mãos de cineastas mais inspirados como Adam McKay ou Greg Mottola, a premissa promissora de “Uma Noite Fora de Série” (2010) bem como os seus protagonistas poderiam render alguns memoráveis momentos de comédia alucinada. Sob a batuta, entretanto, do burocrático Shawn Levy essa produção acaba ficando genérica e comportada demais. A trama clássica da comédia de erros aos poucos vai se diluindo em lições de vida de como preservar o casamento. O filme só respira quando Steve Carrel e Tina Fey disparam piadas e imitações, fazendo com essas cenas pareçam um filme à parte.

quinta-feira, junho 10, 2010

Atraídos Pelo Crime, de Antoine Fuqua ***


O cineasta Antoine Fuqua navega perigosamente entre vários clichês narrativos em “Atraídos Pelo Crime” (2009): o manjado truque das várias tramas paralelas que se entrecruzam, roteiro policial repleto de questões já vistas inúmeras vezes (corrupção na polícia, crime e violência entre marginais em algum bairro barra pesada). O resultando, entretanto, é bem convincente. Mesmo não tendo a mesma dinâmica virulenta de “Dia de Treinamento” (2001), sua melhor produção, Fuqua conduz seu filme com segurança. A atmosfera de tensão é agonizante: os personagens se aprofundam cada vez mais em seus abismos pessoais em uma marcha irreversível para a tragédia. As seqüências de ação são econômicas na quantidade, mas sempre se mostram impactantes – Fuqua mantém um estilo clássico no filmar, não caindo em modernices desnecessárias. O diretor também soube extrair expressivas atuações do seu elenco, com Richard Gere, Ethan Hawke e Don Cheadle oferecendo interessantes nuances para seus sombrios personagens.

quarta-feira, junho 09, 2010

Chico Xavier, de Daniel Filho *1/2


A pretensão de tentar contar a história real de vida de alguém de alguma importância é uma tarefa espinhosa. Afinal, nunca se terá como fazer uma reconstituição de fatos com a mesma veracidade da sua origem. O máximo que se pode conseguir nas cinebiografias é um reflexo da impressão que a figura histórica focada tem sobre as nossas mentes. No extraordinário “O Aviador” (2004), por exemplo, Martin Scorsese trabalha muito mais com a idéia de Howard Hughes e a Hollywood de seu tempo influenciado o nosso imaginário do que propriamente com a simples narração de uma série de eventos dispostos em ordem cronológica. Dentro dessa lógica, “Chico Xavier” (2010) acaba sendo uma experiência cinematográfica muito frustrante, pois o diretor Daniel Filho faz do seu filme um mero desfilar burocrático e linear de algumas das passagens mais importantes da vida do seu protagonista. Independente de se acreditar ou não na doutrina espírita, a impressão que a obra passa é a de ter simplificado uma série de questões complexas. Predomina uma assepsia inócua tanto na encenação como no retratar situações e personagens. A narrativa usa e abusa de uma fórmula: toda subtrama aparece como um desafio para a fé de Xavier e no final se resolve como prova da eficiência da doutrina. Os personagens se dividem de forma maniqueísta em dois tipos – aqueles que acreditam no espiritismo (sempre bons, tolerantes e gentis) e os que não acreditam (geralmente mesquinhos, intolerantes e agressivos).

A impressão final sobre “Chico Xavier” é da mesma ser uma produção destinada a agradar convertidos – Daniel Filho oferece ao seu público justamente aquilo que ele espera saber. Qualquer espaço para uma maior densidade dramática parece suprimido em um produto que beira a propaganda institucional.

segunda-feira, junho 07, 2010

A Dança dos Vampiros, de Roman Polanski ****


O que Roman Polanski estabelece em “A Dança dos Vampiros” (1967) não é simplesmente uma paródia aos filmes de vampiro. Ele traz todos aqueles elementos característicos das obras clássicas do gênero e compõe uma narrativa que na sua essência é um puro conto de horror, mas recheado de toques picarescos. A trama sempre oscila entre o assustador e o ridículo, como se fosse uma velha lenda contada em tom de troça. A encenação proposta por Polanski é bastante ousada, indo de pequenos truques típicos do cinema mudo (como a velocidade acelerada das imagens) até um despudorado uso de erotismo (a valorização voluptuosa da beleza de Sharon, a homossexualidade escancarada de um dos principais vampiros) em clara alusão ao espírito do amor livre tão propagado na década de 1960. Tanto em termos formais quanto temáticos, “A Dança dos Vampiros” se aproxima bastante do espírito naturalista e malicioso das adaptações cinematográficas de Pasolini para clássicos da literatura como “Decameron” (1970) ou “As Mil e Uma Noites” (1974).

sexta-feira, junho 04, 2010

Como Treinar o Seu Dragão, de Dean DeBlois e Chris Sanders ***1/2


Em meio às várias produções de animações em 3D que chegam aos cinemas, “Como Treinar o Seu Dragão” se destaca pela sua beleza de seu traço estilizado e pela dose cavalar de ação em sua trama. É um filme recheado de sequências de batalhas entre vikings e dragões muito bem detalhadas e executadas. O roteiro, entretanto, não é mero pretexto para as cenas de aventura, trazendo um bem vindo e clássico toque cômico, além de mostrar sensibilidade ao desenvolver o relacionamento entre o protagonista Soluço e o dragão Fúria da Noite. É justamente esse relacionamento que desencadeia os pontos de virada da trama, apresentando soluções narrativas muito interessantes. O ápice do conflito final impressiona pelo tom assustador do gigantesco monstro que esmaga tudo que vem pela frente, em um frenesi de violência e destruição que parece tremer a própria sala de cinema. O que, convenhamos, não é algo que se vê com tanta frequência em animações infanto-juvenis...

quinta-feira, junho 03, 2010

Os Estados Unidos Contra John Lennon, de David Leaf e John Scheinfeld ***


A premissa de que o gênero documentário representa a forma mais próxima de que o cinema pode chegar como encenação da realidade (ou da verdade) das coisas pode ser uma falácia. Afinal, em algumas oportunidades, a manipulação de imagens através da edição, junto a um determinado discurso narrativo, pode forjar uma versão dos fatos que beira o ficcional. Isso tudo veio a minha mente quando assisti “Os Estados Unidos Contra John Lennon”. Não que a situação de instituições norte-americana terem entrado em atrito e perseguido o mais polêmico dos Beatles seja uma mentira. O que incomoda é a própria forma como Lennon é retratado no filme, ganhando uma dimensão quase mítica pelas iniciativas que tomou ao promover questionamentos sociais contra a excessiva militarização do mundo ocidental. Nessa perspectiva, o Lennon que vemos na tela é privado de contradições e de uma densidade mais humana. Mesmo assim, não há como negar o mérito do documentário como propaganda de uma lenda: ao dar uma dimensão épica para Lennon, a obra faz com que o espectador saia simpatizando ainda mais com o cara. Além disso, boa parte das imagens de arquivo resgatadas é fascinante, principalmente por enfocar uma época desconcertante (a década de 70 do século passado) na história da humanidade.

quarta-feira, junho 02, 2010

Tulpan, de Sergei Dvorsevoy ***


Essa produção do Cazaquistão não traz muitas novidades dentro daquele padrão de filmes vindo de países fora do eixo tradicional cinematográfico: temática regional, predominância de atores amadores, encenação naturalista que beira o documental. Isso não quer dizer, entretanto, que “Tulpan” (2008) não tenha os seus méritos. A partir de uma trama árida, o diretor Sergei Dvorsevoy consegue obter algumas seqüências memoráveis, principalmente quando se vale de um inesperado senso de humor. As tomadas com o protagonista Askhat e seu parceiro passeando pelo deserto a toda velocidade em um estranho veículo e ao som de um hit da discoteca são genuinamente engraçadas pela ingenuidade da situação e dos personagens. Já as cenas com os ciclones nas areias e os partos de ovelhas impressionam pela crueza poética do registro. No final das contas, “Tulpan” está longe de ser um clássico, mas também está milhas de distância de ser uma obra aborrecida.