quinta-feira, dezembro 28, 2017

Lucky, de John Carroll Lynch ***1/2

Um filme que lide com temas tabus como a morte e a velhice navega em águas perigosas. Dependendo da forma com que aborde tais assuntos, poderá cair no sentimentalismo fácil e no medíocre formato “obra edificante de lição de vida”. “Lucky” (2017) envereda por essa temática sem cair em tais armadilhas. Boa parte dos méritos está em algumas sábias escolhas criativas do diretor John Carroll Lynch. Sua narrativa é seca e objetiva, com econômicos toques oníricos, mas que se permite a algumas sequências pungentes. A cronologia dos fatos que se sucedem no roteiro obedece a uma lógica humanista e de complexidade psicológica, sem esquecer, entretanto, uma atmosfera que sintetiza ironia e um imaginário icônico. As situações da trama inicialmente evocam um teor realista, quase documental, ao evidenciar alguns sistemáticos atos do cotidiano do protagonista Lucky (Harry Dean Stanton). Aos poucos, entretanto, tais episódios vão adquirindo uma forte conotação simbólica, assim como as sutis variações dessa rotina do personagem, a ilustrar uma melancólica e lúcida reflexão sobre a decadência física e a finitude, sem cair necessariamente para a afetação. A caracterização de Stanton no papel título também é fundamental para a contundente concepção artística de Carroll Lynch –  Lucky varia com naturalidade e coerência entre a rudeza sincera e uma fragilidade comovente.

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