quarta-feira, novembro 23, 2016

Elle, de Paul Verhoeven ****

A produção francesa “Elle” (2016) é uma bela síntese das concepções autorais muito particulares do cineasta holandês Paul Verhoeven, combinando refinamento narrativo com um sensorialismo visceral. Estão lá boa parte dos clichês básicos do gênero suspense, mas eles são manipulados com uma elegância fenomenal e ao mesmo tempo também são pervertidos dentro de uma trama repleta de desdobramentos insólitos e um forte conteúdo simbólico (nesse sentido, é antológica a sequência do jantar de natal, em que a composição e dinâmica da mesa reflete as divisões sócio-econômicas-culturais da sociedade ocidental contemporânea). O roteiro em sua primeira metade até insinua um formato que evoca a atmosfera de algumas obras de Alfred Hitchcock, principalmente naquela fórmula “quem é o culpado”, mas esse direcionamento aparentemente convencional vai se tornado cada vez mais difuso, com Verhoeven transformando a narrativa numa espécie de perturbadora parábola moral. Os dilemas e contradições da protagonista Michèle (Isabelle Huppert) são complexos e por vezes até bizarros, mas exalam uma humanidade crua e contundente na forma plural com que as diversas facetas da personagem se expõem e interagem (sentimental/existencial/profissional). Esse contexto temático repleto de nuances recebe um tratamento formal bastante lapidado, com destaque para a encenação precisa na sua junção de naturalidade e detalhismo imagético, vide as intensas cenas de sexo e violências (aliás, na melhor tradição Paul Verhoeven), e as sequências em que os games eletrônicos se inserem na narrativa, guardando uma correlação irônica sensacional com aquilo que se passa no mundo “real” da trama, além da trilha sonora tensa e sedutora e o elenco de atuações antológicas (Huppert, por sinal, num dos grandes momentos de sua expressiva carreira).

Um comentário:

Marcelo Castro Moraes disse...

Disparado um dos melhores filmes do ano