sexta-feira, fevereiro 03, 2017

O apartamento, de Asghar Farhadi ***

O cinema do diretor iraniano Asghar Farhadi se formata dentro de uma fórmula temática e narrativa simples – a partir de uma estrutura de melodrama, as obras se configuram aos poucos como parábolas morais, em que determinadas situações de roteiro adquirem um caráter simbólico ao retratar a repressão religiosa, moral e política no Irã contemporâneo. “O apartamento” (2016) é mais um trabalho de Farhadi que segue esse método. O cineasta não recorre tanto aos truques estéticos e emocionais inerentes a esse tipo de obra, sendo que em boa parte da narrativa predomina a sobriedade e até uma secura na forma que a trama e os personagens vão se delineando, além da bela sacada textual de relacionar o desenvolvimento da história com a encenação da montagem da peça “A morte de um caixeiro viajante”, mostrando os paralelos entre as duas narrativas no que tange a temática das hipocrisias sociais e econômicas a oprimir os indivíduos. A tensão dramática consegue ser constante e por vezes até perturbadora, e o fato da abordagem objetiva habitual da direção de Farhadi ser mantida preserva a complexidade e a dureza dos dilemas e contradições presentes no roteiro. Ainda que seja admirável essa coerência artística e existencial, incomoda em “O apartamento” a falta de sequências em que haja alguma transcendência maior em termos de linguagem cinematográfica, e que se acentua ainda mais pelo convencionalismo excessivo que predomina no terço final do filme. Não há aquela ousadia e mesmo sensibilidade artísticas que tornam tão peculiares as obras de outros diretores de seu país, como Jafar Panahi e Abbas Kiarostami.

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