terça-feira, abril 18, 2017

Cães selvagens, de Paul Schrader ***1/2

Não é muito frequente que um filme de Paul Schrader apareça nos cinemas brasileiros. E dá para entender o motivo – sua carreira como diretor é errática e imprevisível, ainda que tenha uma quantidade considerável de obras memoráveis. “Cães selvagens” (2016) é uma demonstração enfática do caráter conturbado da arte de Schrader. Ao invés das rigorosas narrativas bressorianas de “O gigolô americano” (1980) e “O acompanhante” (2007), nessa produção mais recente o cineasta envereda por uma concepção mais anárquica e delirante, como se quisesse evocar uma longa trip alucinada movida a cocaína e crack. Ainda assim, seu direcionamento estético nunca perde a coerência existencial e um forte traço autoral – ainda que se abuse de truques gráficos e de uma direção de fotografia de cores estouradas, além de uma barulhenta trilha sonora baseada em temas rock e eletrônico, paira sobre a narrativa e a atmosfera do filme um certo classicismo que impede que tudo caia na mera estilização estéril. Mesmo o tom over das atuações do elenco, com destaque para a interpretação extraordinária de Willem Dafoe, consegue se enquadrar de maneira precisa dentro do conceito ambíguo da obra. As escolhas formais de Schrader acentuam com sensibilidade e humor o tom misto de melancolia e sordidez do roteiro, que faz um retrato vigoroso e irônico da rotina de marginais e perdedores. Nesse sentido, as sequências finais de “Cães selvagens” são exemplares na forma com que sintetizam o particular ideário-artístico e temático arquitetado pelo diretor e também por evidenciarem a moral difusa e hipócrita do “american way of life”.

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