quinta-feira, julho 07, 2016

Tudo vai ficar bem, de Wim Wenders ***

Em “A paixão de JL” (2014), fascinante misto de documentário/ensaio/diário pessoal concebido por Carlos Nader que faz uma espécie de síntese do imaginário e das impressões intimistas do artista plástico José Leonilson, há uma presença forte do cineasta alemão Wim Wenders na narrativa. Tanto que são exibidos trechos de três de seus filmes da década de 80 (“Um filme para Nick”, “Paris, Texas” e “Asas do desejo”). Isso reforça como Wenders foi uma influência fundamental na configuração cultural e mesmo existencial de uma geração de cinéfilos e artistas em geral, tanto por estabelecer a sua temática recorrente da busca de identidade própria do ser humano contemporâneo como na consolidação de uma estética que valoriza da mesma maneira o modo americano quase intuitivo de filmar e o estilo reflexivo e cerebral tipicamente germânico de conceber a narrativa cinematográfica. Dessa forma, chega a ser uma curiosa coincidência do destino que a mais nova produção de Wenders, “Tudo vai ficar bem” (2015), tenha entrado em cartaz ao mesmo tempo que o filme de Nader ainda estava presente nos circuitos de cinema. Num primeiro momento, esse acaso pode até ser infeliz para o trabalho recente de Wenders, no sentido de se fazer inevitáveis comparações e se constatar que ele é bem inferior às obras citadas em “A paixão de JL”. Há algumas concessões formais e excessos solenes e sentimentais que comprometem a marca autoral do diretor. Ainda assim, por alguns momentos Wenders mostra que ainda é capaz de preservar uma elegância artística na condução da narrativa, conseguindo obter uma atmosfera estranha e cativante ao contar a história de um escritor (James Franco) que percebe que extrair inspiração de situações trágicas é um eficiente recurso literário. Nas mãos de um diretor qualquer, tal história poderia se converter num simples conto moralista, mas sob o olhar de Wenders ganha contornos irônicos bem interessantes. A sequência, por exemplo, em que o protagonista é estapeado por uma rancorosa ex-esposa (Rachel McAdams) é memorável no seu sutil sarcasmo. Assim, por mais que “Tudo vai ficar bem” esteja distante de entra numa antologia dos melhores filmes de Wenders, é bem mais interessante que a hagiografia institucional de “O sal da terra” (2014).

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