quinta-feira, dezembro 04, 2014

O pequeno fugitivo, de Morris Engel e Ruth Orkin ***1/2



Dizer que “O pequeno fugitivo” (1953) parece distante daquilo que se faz atualmente no cinema pode até ser correto, mas também é impreciso. Afinal, o filme em questão parece algo fora do tempo e espaço em relação a qualquer época. A linguagem estética adotada pelos diretores Morris Engel e Ruth Orkin encontra bastante ressonância naquele estilo de fotografia naturalista, em que o preto-e-branco enfatizava um misto entre a simplicidade, o sórdido, o excêntrico e o irônico no registro de tipos nada glamorosos dos grandes centros urbanos. A estrutura narrativa engedrada por Engel e Orkin é marcada pela concisão e eficiência – ao usar técnicas documentais na encenação de uma história ficcional, eles conseguem a proeza de fazer uma estranha e fascinante síntese entre a formatação naturalista e o inesperado tom fabular. Isso porque a trama é perpassada em boa parte de sua duração pelo olhar infantil do protagonista Joey (Richie Andrusco). Assim, aquilo que era para ter um caráter prosaico e realista acaba ganhando uma estranha dimensão épica para o pequeno personagem principal. Os jogos e brincadeiras em um parque e os passeios e recolhimento de garrafas pela praia de Coney Island se transformam numa espécie de aventuras grandiosas. O registro visual do filme acentua ainda mais tal impressão: poucas vezes se viu no cinema ruas, objetos e prédios corriqueiros ganharem uma beleza pictórica tão cativante. A expressiva trilha sonora, composta basicamente por temas de melodias singelas levadas numa harmônica beirando o desafinado, colabora ainda mais para essa percepção de uma obra idiossincrática e atemporal.

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