terça-feira, agosto 01, 2017

Gatos, de Ceyda Torun ***1/2

A intenção do diretor Ceyda Torun em “Gatos” (2016) não é apenas mostrar como os felinos são animais peculiares e cativantes (ainda que faça isso muito bem). Perpassa por toda a narrativa do filme um sutil conceito artístico-existencial – ao mostrar a relação cotidiana entre os moradores de Istambul com gatos de ruas, a obra valoriza um forte teor humanista e que por vezes insinua uma atmosfera de mistério típico que ronda o imaginário sobre tais animais. Em um mundo cada vez mais marcado pelo avanço capitalista-tecnológico desumanizador, a convivência entre humanos e felinos remete a uma ligação mais profunda com a natureza e mesmo com o desconhecido. No caso dos bichos em questão, tal relacionamento é ainda mais fascinante, no sentido que a personalidade de gatos é algo que beira o inescrutável. Afinal, eles são bem mais imprevisíveis que outros animais domésticos, tendo em várias situações atitudes inexplicáveis até para aquilo que é considerado instintivo. Tal caráter indomável revela um perfil de desafio perante à ordem “humana”, o que ajuda a explicar boa parte do fascínio que eles exercem. O filme de Torun consegue captar com sensibilidade e contundência toda essa complexidade de sensações e comportamentos, oferecendo um formalismo repleto de nuances estéticas extraordinárias que realçam com vigor a beleza e a estranheza de tal universo temático, vide a direção de fotografia de notável detalhismo imagético e o misto de exotismo e pungência dos temas musicais da trilha sonora (aliás, dentro desse conjunto audiovisual, não há como não se lembrar de outro marcante documentário ambientado em Istambul, “Atravessando a ponte”).

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