quarta-feira, fevereiro 07, 2007

Kiss Me, de António da Cunha Telles *


Olha, vou confessar uma coisa: eu tenho uma baita bronca com o Giuseppe Tornatore. Não que o cara seja um mau cineasta. Ele é um bom diretor. O problema do Tornatore é que o mesmo fez “Cinema Paradiso”, um filme até interessante, mas que se tornou modelo para uma série de produções medíocres que a maioria das pessoas teima em dizer que se trata de cinema “de verdade”. Tais filmes obedecem criteriosamente a seguinte fórmula: um personagem qualquer começa a se lembrar das coisas de infância e adolescência, sendo em que tal período o mancebo tinha como conselheiro alguém mais experiente cheio de sabedoria e carisma (e que quase sempre morre no final). Bem, nessa trama teremos momentos cômicos se alternando com outros sentimentalóides. Por fim, aquele personagem do início e nós, espectadores, receberemos uma lição de vida e sairemos do cinema nos sentindo gratificados por sentirmos que assistimos uma obra que acrescentou algo para a nossa existência. No meio disso tudo, provavelmente teremos algumas seqüências bem fotografadas mostrando paisagens campestres e interioranas para atestar que estamos assistindo a uma obra de qualidade artística. Quantas vezes já assistimos esse filme lá no Guion ou outra sala chique no meio de várias adoráveis velhinhas?? De cabeça, nos últimos dois anos eu posso citar algumas variações dessa fórmula: “Elsa e Fred”, “Tempero da Vida” e esse “Kiss Me”.

A descrição que fiz acima dos genéricos de “Cinema Paradiso” já serve quase como resumo do que é “Kiss Me”, produção portuguesa de 2004. A personagem que dá as tais lições de vida é Laura (a gostosa e inexpressiva Marisa Cruz), uma cabeleireira fã de Marilyn Monroe, que enfrenta os preconceitos de uma cidadezinha interiorana pelo fato de ser uma mulher “liberada”. Pois é, a grande transgressão da mesma é transar com metade da cidade... E o mais incrível é que o filme se passa durante boa parte da ditadura de Salazar e em nenhum momento a tal da Laura parece interagir com isso!! O filme todo é narrado pelo filho da nossa heroína e a todo o momento ele nos dá a entender que estamos ouvindo um relato de alguém que desafiou todas as convenções. Só não entendemos que convenções são essas...

Por fim, tenho uma sugestão para o programador do Guion: tentar conseguir esse “Kiss Me” para exibir na sua sala. Provavelmente ele terá um bom público de senhoras respeitáveis e pseudo-intelectuais que sairão muito comovidos da sala de cinema.

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