quinta-feira, maio 28, 2009

O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro, de Glauber Rocha ****


Por mais que haja resenhas, biografias, ensaios e o diabo a quatro sobre Glauber Rocha, a verdade é que há sempre algo de novo para se falar na revisão de suas obras. "O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro" (1969), por exemplo, é um filme que vi faz uns quinze anos na televisão e na época fiquei bastante impressionado. Assistindo recentemente no cinema a uma cópia restaurada de tal obra pude perceber ainda mais o impacto sensorial da mesma. Glauber usa na superfície uma trama que remete a uma espécie de faroeste caboclo (desculpe, Renato Russo, tu chegaste tarde...), mas que na verdade é apenas uma base para um verdadeiro caleidoscópio de idéias e concepções. Confronta-se questões sociais com visões místicas, misturando macumba e materialismo dialético, enquanto tudo o que poderia de haver de linear e naturalista no roteiro vai se dissolvendo em simbolismos e numa montagem que fragmenta ao máximo a narrativa. Dessa forma, dizer que "O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro" é um filme de teor rebelde apenas pelo conteúdo da sua trama é uma verdadeira miopia. O que é subversivo no filme é muito mais que isso: o que transgride também é o seu aspecto formal, que em nenhum momento oferece sossego para os olhos do espectador, numa gama de citações, referências, sons e imagens que estabelecem um imaginário cinematográfico poderoso e inesquecível. Como não tirar da nossa memória a figura melancólica e assustadora de Antônio das Mortes, a perversão de música regional de Sérgio Ricardo, a fotografia que registra um sertão tão próximo e que ao mesmo parece ser de outra dimensão? Por mais que os detratores de Glauber possam acusar o seu cinema de ser superado, a realidade é que mesmo hoje em dia sua obra ainda revela traços inquietantes, além de apontar caminhos a serem explorados para buscar uma linguagem própria do cinema brasileiro. "O Dragão da Maldade Contra o Santo Guerreiro" é prova contundente disso.

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