Poucos meses atrás, tive uma grata surpresa ao assistir “A Esquiva” (2004), do diretor tunisiano Abdel Kechiche. Tendo como cenário um subúrbio francês e tendo como personagens jovens descendentes de emigrantes árabes, a obra tinha uma dinâmica extraordinária, conciliando de maneira admirável uma temática de forte cunho social com um senso de humor fantástico. Em “O Segredo do Grão” (2007), obra mais recente de Kechiche, o diretor retoma basicamente o mesmo cenário e o mesmo tratamento narrativo, obtendo um resultado de impacto ainda maior. Tanto a fotografia quanto a montagem oferecem uma fluidez impressionante para a trama chegando ao ponto de se ter a impressão de assistir a um documentário de cenas do quotidiano tamanho o naturalidade com que os fatos vão se sucedendo. Nada parece ensaiado, os atores parecem não interpretar, apenas agem, os diálogos parecem brotar do momento, o que faz com que as palavras sejam proferidas com intensidade e veracidade raras de ver nas telas. Nesse contexto, é até injusto tentar destacar seqüências específicas do filme, tendo em vista a unidade e a coerência formais que permeiam “O Segredo do Grão”. Mas é provável que uma boa parte dos apreciadores de cinema leve para sempre na memória de momentos antológicos cinematográficos a majestosa seqüência final em que dois planos narrativos se alternam e se complementam: a corrida desesperada e melancólica até o esgotamento físico (ou vital?) do protagonista Slimane Beiji em busca da sua motocicleta roubada e a luxuriosa dança do ventre executada pela enteada de Slimane, Rym (em caracterização possessa da jovem Hafsia Herzi), numa estranha e bela dicotomia entre sexo e morte.
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