terça-feira, maio 05, 2015

O Gebo e a Sombra, de Manoel de Oliveira ***


Os detratores do cineasta português Manoel de Oliveira, recentemente falecido, podem dizer o que quiserem dos seus filmes, mas pelo menos uma coisa eles terão de reconhecer: pode-se perceber em grande parte de sua obra um traço autoral muito particular, como se todas essas produções habitassem um universo à parte daquilo que tem aparecido nos cinemas nos últimos tempos. “O Gebo e a Sombra” (2012), seu derradeiro trabalho, pode não ser a sua obra-prima, mas tem o inegável mérito de ser uma eficiente síntese de suas obsessões formais e temáticas. A narrativa se configura dentro de uma encruzilhada em que se batem elementos de literatura e cinema. Esse choque faz com que a linguagem estética adquira um estranho caráter mestiço. Oliveira abdica do naturalismo, mas isso não quer dizer que a trama habite um plano delirante ou onírico. Sua encenação seca e precisa enfatiza a beleza rigorosa do texto literário que serviu de base ao filme, sem deixar também de valorizar a encanto de uma composição visual detalhista e estilizada. As interpretações do elenco se mostram em sintonia com as concepções artísticas do cineasta, num misto de declamações que beiram o poético e de um desconcertante distanciamento emocional. Os métodos de Oliveira de filmar e editar são radicais na idealização e execução, exigindo do espectador uma forte abstração para poder penetrar nessa dimensão sensorial diferenciada. O resultado, por vezes, é recompensador para quem se dispor a embarcar nessa viagem audiovisual típica do diretor luso.

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