Os detratores do cineasta português Manoel de Oliveira, recentemente
falecido, podem dizer o que quiserem dos seus filmes, mas pelo menos uma coisa
eles terão de reconhecer: pode-se perceber em grande parte de sua obra um traço
autoral muito particular, como se todas essas produções habitassem um universo à
parte daquilo que tem aparecido nos cinemas nos últimos tempos. “O Gebo e a
Sombra” (2012), seu derradeiro trabalho, pode não ser a sua obra-prima, mas tem
o inegável mérito de ser uma eficiente síntese de suas obsessões formais e temáticas.
A narrativa se configura dentro de uma encruzilhada em que se batem elementos
de literatura e cinema. Esse choque faz com que a linguagem estética adquira um
estranho caráter mestiço. Oliveira abdica do naturalismo, mas isso não quer
dizer que a trama habite um plano delirante ou onírico. Sua encenação seca e
precisa enfatiza a beleza rigorosa do texto literário que serviu de base ao
filme, sem deixar também de valorizar a encanto de uma composição visual
detalhista e estilizada. As interpretações do elenco se mostram em sintonia com
as concepções artísticas do cineasta, num misto de declamações que beiram o poético
e de um desconcertante distanciamento emocional. Os métodos de Oliveira de
filmar e editar são radicais na idealização e execução, exigindo do espectador
uma forte abstração para poder penetrar nessa dimensão sensorial diferenciada. O
resultado, por vezes, é recompensador para quem se dispor a embarcar nessa
viagem audiovisual típica do diretor luso.
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