sexta-feira, fevereiro 19, 2016

A humanidade, de Bruno Dumont ****

No universo artístico do diretor francês Bruno Dumont, todos os elementos formais e temáticos parecem obedecer a uma lógica muito particular do cineasta. Nessa inusitada dimensão estética e existencial, cabe influências pontuais que se combinam e fundem dentro de uma forte assinatura autoral de Dumont. Há espaço para o ascetismo religioso e estilístico de Robert Bresson, para preceitos típicos do neo-realismo de Roberto Rossellini, para uma ambientação que por vezes beira o delirante e que chega a lembrar tanto o surrealismo de Luis Buñuel quanto o onirismo perverso de David Lynch. Esse estilo único foi sendo burilado ao longo de anos e atingiu se ápice criativo no recente “O pequeno Quinquin” (2014), mas já havia apresentado momentos brilhantes em outras obras de Dumont. “A humanidade” (1999) representa um desses momentos. Por trás de uma trama que evoca traços do gênero suspense policial, a narrativa aos poucos vai se configurando como uma espécie de conto moral, com personagens que se desenvolvem mais como figuras icônicas do que como seres “reais”, ainda que cenários e atmosfera tragam uma carga naturalista. A encenação de Dumont se desenvolve por caminhos variados, indo de atmosferas sórdidas até um tom solene misto de ironia e misticismo. A abordagem de Dumont é sempre intrincada, mas gera um encanto estranho e perturbador para o espectador, fazendo com que “A humanidade” seja uma contundente amostra do poder do diretor como um dos realizadores cinematográficos mais desconcertantes da atualidade.

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