sexta-feira, novembro 26, 2010

Deixa Ela Entrar, de Thomas Alfredson ****


O diretor Tomas Alfredson não apresenta grandes inovações ou invencionices em “Deixa Ela Entrar” (2008). Opta-se por um estilo clássico na concepção formal, mas sempre com classe e sensibilidade raras. O ritmo lento da narrativa é hipnótico e nunca cai no enfadonho, pois tudo o que se mostra na tela é relevante, o que faz com que não se consiga desgrudar os olhos da mesma. A câmera faz travellings insinuantes e reveladores, o que acentua ainda mais o clima de tensão que paira permanentemente. A seqüência em que a vampira Eli se apresenta pela primeira vez ao menino Oskar no fantasmagórico playground do prédio em que moram é um exemplo sensacional dessa concepção formal, com a câmera fazendo um movimento que corresponde ao olhar do garoto que paira no final exatamente na figura de Eli que surge no meio dos brinquedos como se tivesse saído repentinamente do meio das sombras. Aliás, esse é outro ponto forte da direção de fotografia de “Deixa Ela Entrar”: o cuidado com a iluminação aproveita de forma sensacional a ambientação gélida das tomadas externas no meio da neve. Essa construção de uma ambientação sombria e mórbida também recebe a contribuição de uma sóbria edição de poucos cortes. Alfredson faz também um uso econômico, mas tremendamente eficaz, da violência e de efeitos especiais, em que se valoriza ao extremo a atmosfera de suspense até ao ponto que quando finalmente a brutalidade e o sangue irrompem isso se dá de forma impactante.

A estrutura formal de “Deixa Ela Entrar” oferece um molde exato para o estranho conto de amor e morte representado na sua trama. Não há uma preocupação com explicações e justificativas para situações e personagens: Alfredson apenas tem a intenção de fazer do mistério o mote principal e constante do filme. Também não há a ação de evidenciar qualquer espécie de moral que salve ou castigue. Eli mata as suas vítimas, mas não se regojiza ou se culpa por isso: na sua lógica, sugar o sangue das pessoas representa apenas a sua sobrevivência. Assim, o fato de criarmos simpatia ou não por determinados personagens, mesmo que eles sejam tão críveis e bem construídos (o que é o caso deles em “Deixa Ela Entrar”), não representa um fator que evite que eles sejam abatidos pela menina, mas também não impede sequências imersas em poesia melancólica como aquela da morte do pai de Eli. E se outros personagens eventualmente possam merecer uma morte sangrenta e impiedosa (como na seqüência no ginásio das piscinas em que os garotos do grupo que atormentava Oskar são implacavelmente destroçados), pior para eles...

“Deixa Ela Entrar”, na sua estrutura de conto de fadas amoral, resgata a essência do gênero horror naquilo que ele tem de mais primordial: a extrapolação da realidade, a perpetuação do mistério e o medo do desconhecido. Assim como em “O Nevoeiro” (2007) e “Arrasta-me Para o Inferno” (2009), demonstra ainda a capacidade do universo do fantástico em fascinar e amendrontar o imaginário das platéias.

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