Na superfície, “O Grande Êxtase do Entalhador Steiner” (1973) é um documentário a retratar o ápice de superação de Walter Steiner, campeão mundial de salto de esqui, que atinge sucessivamente impressionantes recordes mundiais. Na essência, entretanto, é obra que mostra a construção de mito, retratando o momento exato em que o homem se converte em lenda vida. Quando está fora da plataforma de salto e sem os esquis, Steiner é uma criatura tímida e desajeitada, de ar quase introspectivo. Quando entra em ação, ganha uma postura que beira a divindade, praticamente um semideus a desafiar os limites da velocidade e da gravidade. A forma com que Herzog registra os saltos de Steiner também colabora para a construção de tal dimensão épica: enquadramentos inusitados e uma câmera lenta que capta todas as nuances da performance do esquiador dão a impressão de que estamos vendo algum ser alado tirado de algum conto fantástico invadindo a nossa realidade. Mas se Herzog expõe um olhar admirado pelas proezas de seu protagonista, ele também reserva a lembrança de que o limite entre a glória mitológica e a dura realidade do fracasso é muito tênue – há sequências que trazem casos de saltos que resultaram em tragédias, como se o diretor lembrasse da própria fragilidade física humana diante de uma tentativa frustrada. Essa contraposição entre o sucesso e o fracasso estimula o questionamento sobre os motivos reais de um homem como Steiner a tentar ultrapassar cada vez mais as suas próprias marcas. A falta de uma resposta plausível acentua a aura de mistério que permeia “O Grande Êxtase do Entalhador Steiner”.
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