A formatação narrativa de “Hamlet” (2014) faz lembrar o
extraordinário “César deve morrer” (2012). Mas enquanto o filme dos irmãos Taviani
se concentrava na recriação dramática da encenação por presidiários de outra célebre
peça shakesperiana, “Júlio Cesar”, a produção dirigida pelo brasileiro
Cristiano Burlan traz uma abordagem mais intrincada. Apesar de apresentar
fortes influências de cinema documental, gênero no qual Burlan se iniciou, a
obra é ficcional na sua concepção artística. Num primeiro momento, parece que o
foco principal seria o registro dos ensaios de mais uma versão para o grande clássico
de Shakespeare. Aos poucos, entretanto, há uma expansão daquilo que é filmado.
Os atores começam a discutir e recriar diálogos, os textos são passados fora do
âmbito do teatro, há estranhas passagens marcadas por um tom onírico e
delirante, elementos culturais contemporâneos e regionais são incorporados com
naturalidade à adaptação. É claro que Burlan está longe de ter a mesma precisão
e sensibilidade narrativas dos irmãos Taviani. Ainda assim, seu “Hamlet” é
inquietante na sua visão artística, buscando possibilidades criativas insólitas
a partir de um dos mais recorrentes textos literários de todos os tempos.
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