Filmes sobre psicopatas que cometem assassinatos em
série não são propriamente uma novidade. O que chama a atenção em “Na próxima,
acerto no coração” (2014) é a sóbria abordagem que o diretor Cédric Anger
oferece para contar a história real de um desiquilibrado policial que se
dedicava assassinar mulheres nas suas horas vagas em uma cidadezinha do
interior da França nos anos 70. Assim, a tensão dramática não está concentrada
de forma principal nas violentas mortes das vítimas e na investigação para que
se descubra a identidade do matador. O foco da narrativa está no cotidiano do
protagonista Franck Neuhart (Guillaume
Canet), mostrando tanto os fatos banais do seu dia-a-dia quanto a sua
rotina estranha de auto-fragelamentos, treinamentos de condicionamento físico e
caçadas de suas “presas”. O formalismo adotado por Anger é marcado por um tom
seco e sem grandes ousadias estéticas, mas que se mostra em adequada sintonia
com a proposta de uma narrativa naturalista que dispensa exageros e
maniqueísmos. O distanciamento emocional do registro da produção acentua ainda
mais essa propensão para uma estética realista. Apesar desse viés áspero da
temática e do tratamento formal, o filme tem uma dimensão humanista forte ao
mostrar as complexas nuances do comportamento errático do personagem principal.
Os significados de suas atitudes tanto carregam no simbolismo (Neuhart se vê
como um guerreiro com uma missão que beira o divino) quanto na psicologia de
almanaque (sua agressividade contra mulheres parece esconder uma
homossexualidade reprimida). É nessa ambiguidade perturbadora que se encontra o
principal ponto forte de “Na próxima, acerto no coração” – a capacidade de
fazer com que o espectador sinta até compaixão por Neuhart mesmo diante de sua
demência assassina.
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