quarta-feira, agosto 26, 2015

Na próxima, acerto no coração, de Cédric Anger ***

Filmes sobre psicopatas que cometem assassinatos em série não são propriamente uma novidade. O que chama a atenção em “Na próxima, acerto no coração” (2014) é a sóbria abordagem que o diretor Cédric Anger oferece para contar a história real de um desiquilibrado policial que se dedicava assassinar mulheres nas suas horas vagas em uma cidadezinha do interior da França nos anos 70. Assim, a tensão dramática não está concentrada de forma principal nas violentas mortes das vítimas e na investigação para que se descubra a identidade do matador. O foco da narrativa está no cotidiano do protagonista Franck Neuhart (Guillaume Canet), mostrando tanto os fatos banais do seu dia-a-dia quanto a sua rotina estranha de auto-fragelamentos, treinamentos de condicionamento físico e caçadas de suas “presas”. O formalismo adotado por Anger é marcado por um tom seco e sem grandes ousadias estéticas, mas que se mostra em adequada sintonia com a proposta de uma narrativa naturalista que dispensa exageros e maniqueísmos. O distanciamento emocional do registro da produção acentua ainda mais essa propensão para uma estética realista. Apesar desse viés áspero da temática e do tratamento formal, o filme tem uma dimensão humanista forte ao mostrar as complexas nuances do comportamento errático do personagem principal. Os significados de suas atitudes tanto carregam no simbolismo (Neuhart se vê como um guerreiro com uma missão que beira o divino) quanto na psicologia de almanaque (sua agressividade contra mulheres parece esconder uma homossexualidade reprimida). É nessa ambiguidade perturbadora que se encontra o principal ponto forte de “Na próxima, acerto no coração” – a capacidade de fazer com que o espectador sinta até compaixão por Neuhart mesmo diante de sua demência assassina.

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