A seqüência inicial da produção argentina “A Janela” (2008) é de uma beleza formal e emocional devastadora: no formato de um antigo e desgastado filme do início do século XX, é mostrada a mais remota lembrança infantil de Antonio, um escritor idoso e já bem debilitado. A partir desse momento, o diretor Carlos Sorin começa a narrar o último dia da vida de Antonio em sua fazenda em algum posto afastado do interior da Argentina. Usando de um estilo que se aprofunda em longos planos e silêncios, o cineasta põe em cena discretamente alguns elementos dramáticos: discussões sobre os problemas de saúde de Antonio, um nervoso devedor do protagonista, a volta do filho que partiu há muitos anos, a nora estressada com chamadas para o seu celular que nunca chegam e até uma desastrada fuga do velho pelos campos. A impressão que se tem, entretanto, é que todas esses conflitos vão se dissolvendo para Antônio até restar apenas uma prosaica questão: quem era aquela moça que cuidou dele no aludido episódio de sua infância? É como se no fim da vida tudo aquilo que compôs a existência de um indivíduo (família, trabalho, dinheiro, as realizações pessoais, orgulho) fosse removido, e daí se indagasse: o que restou? Na morte, o velho novamente se torna um pequeno menino e seu único interesse é receber um carinho feminino. Essa constatação é exposta de forma serena e desconcertante, e é na naturalidade desse desnudamento da alma que reside grande parte da força de “A Janela”.
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