O diretor Eduardo Coutinho havia criado um universo tão
particular dentro do gênero documentário que podia se dar ao luxo de até fazer
continuações de seus filmes sem parecer oportunista. Esse é justamente o caso
de “A família de Elizabeth Teixeira” (2014), obra que dá sequência natural aos
fatos narrados no clássico “Cabra marcado para morrer” (1984). No filme mais
recente, o cineasta mostra o que aconteceu com a protagonista da obra anterior,
Elizabeth, e os seus filhos. Um dos grandes talentos de Coutinho como
documentarista era conseguir a partir de pequenos retratos intimistas fazer uma
amostragem lúcida e profunda das contradições e dilemas da sociedade
brasileira. Na obra em questão, tal capacidade se aflora com intensidade – ao mesmo
tempo que a trajetória pessoal de cada um dos indivíduos focados comove pelo
alto grau de espontaneidade e crueza que o diretor extrai de seus
entrevistados, tais depoimentos também são reveladores das raízes de exploração
econômica e injustiça social entranhadas na essência do Brasil. O documentário
também evidencia como o próprio Coutinho cada vez mais ia se tornando um
personagem atuante dentro de seus próprios filmes, interagindo com as demais
figuras em cena, mas sem em nenhum momento soar forçado ou egocêntrico. É como
se o forte caráter humanista de sua abordagem exigisse sua presença física no
enquadramento para complementar o sentido existencial de seus filmes.
Comentários afirmam que antes de morrer Coutinho já tinha
deixado filmada uma nova obra, com tal produção se encontrando na fase de
montagem. Mesmo assim, dá para dizer que “A família de Elizabeth Teixeira” é um
contundente canto do cisne de um dos maiores diretores da história do cinema
brasileiro.
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