Como em seu filme posterior, “Fruto do paraíso” (1969), a
diretora tcheca Vera Chytilová abdica da narrativa convencional em “As pequenas
margaridas” (1966). Só que nesse último a viagem é ainda mais radical. Ao invés
do tom fabular que impregna “Fruto...”, a cineasta investe numa narrativa ainda
mais livre e fragmentada, em que o espírito anárquico domina tanto o seu
formalismo quanto a parte temática. Há cortes abruptos, pequenas cenas
inseridas de forma que beiram o aleatório, encenações que emulam comédias
amalucadas norte-americanas dos anos 20 e 30. A atmosfera pode ser libertária em todos os
sentidos, mas também sempre se percebe o senso estético e textual rigoroso de
Chytilová a dar uma estranha coesão a toda essa loucura. E é também perceptível
que há sintonia entre essa delirante forma de filmar e editar com os eflúvios
contraculturais sessentistas, sem que necessariamente o filme possa ser
considerado datado – a forte veia contestatória e ácida de “As pequenas
margaridas” é atemporal.
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