Num determinado debate, não lembro precisamente a data,
tendo como tema crimes bárbaros que recebiam grande atenção da mídia
sensacionalista, o jornalista Paulo Francis, diante de uma suposta perplexidade
da sociedade perante a brutalidade e gratuidade de tais atos violentos, apenas
respondia que todas as respostas para essas indagações já estavam presentes nas
tragédias gregas escritas há centenas de anos. Isso me veio à mente quando
assisti a “O lobo atrás da porta” (2013). Nessa produção nacional, o diretor
Fernando Coimbra pega um caso real do seqüestro e assassinato de uma criança
nos subúrbios de Rio de Janeiro e formata a narrativa como se fosse justamente
uma espécie de tragédia grega. A trama não se desenvolver numa linha tão linear
– há uma alternância freqüente entre presente e passado, mas o ritmo da
narrativa é objetivo e nada confuso. Além disso, Coimbra coloca os fatos do
roteiro expostos a partir das diferentes percepções do trio de personagens principais
– a amante infanticida (Leandra Leal), o marido adúltero (Milhem Cortaz) e a
esposa traída e mãe desesperada (Fabíula Nascimento) – fazendo lembrar o clássico
“Rashmoon” (1950) de Akira Kurosawa. O fato da história se desenvolver em
locais da capital carioca fora do padrão “turístico” torna a atmosfera da obra
ainda mais insólita e sufocante. Mas o que faz de “O lobo atrás da porta” uma
obra tão desconcertante é a sutil e desafiadora simbologia que Coimbra imprime
em cada ato de seus personagens: ao invés de um mero caráter atônito ou
distante perante a tragédia que se desenrola de forma inexorável ao longo do
filme, o cineasta revela uma visão implacável e arguta sobre o machismo e o
preconceito na sociedade patriarcal ocidental, em que a defesa da moral e da
honra esconde um universo de sociopatia e opressão.
Um comentário:
Desde já um dos melhores filmes brasileiros do ano.
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