Depois do claudicante “O abismo prateado” (2011), é animador
ver o diretor Karin Aïnouz retomando em “Praia do futuro” (2014) a pegada
vigorosa de obras como “Madama Satã” (2001) e “O céu de Suely” (2006). Nesse
seu filme mais recente, o cineasta constrói uma obra de atmosfera rarefeita,
algo como se fosse um épico existencial. As ações de suas criaturas são
nebulosas, indecisas, mas sempre de impacto emocional contundente. Aïnouz não
parece interessado em explicar a psicologia dos personagens – a caracterização
pessoal deles está lá, meio escondida, e o que os torna fascinantes é
justamente a imprecisão de suas motivações. Mas se a abordagem intimista é
marcada por esse tom de indefinição, o formalismo de “Praia do futuro” é tomado
por um senso de virtuosismo cinematográfico admirável, a começar pela antológica
abertura de uma alucinada corrida de motos no meio de dunas nordestinas ao som
do rock anfetamínico “Ghost Rider” do Suicide. Tanto a direção de fotografia
quanto a edição privilegiam um olhar sensorial – poucas vezes tomadas aquáticas
passaram uma gama tão variada de sentimentos e sensações (angústia, paz,
erotismo, morte). As fortes cenas de sexo também fogem bastante daquele trivial
que se convencionou no cinema contemporâneo – a intensidade do enlace dos
corpos de Donato (Wagner Moura) e Konrad (Clemens Schick) representa o embate
de sentimentos contraditórios entre os amantes. Essa ambiguidade nos confrontos
pessoais é a síntese virulenta de “A praia do futuro” dessa conjunção de estética
a flor-da-pele com um conteúdo temático de forte teor humanista.
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