O grande mérito das peças escritas pelo dramaturgo Plínio Marcos
é a combinação insólita e natural da estrutura clássica de tragédia com uma
brasilidade crua, em histórias repletas de violência, linguagem direta e
coloquial (às vezes escancaradamente chula) e personagens malandros e/ou
marginais. A transposição para o cinema de “A navalha na carne” (1969) concebida
e executada por Braz Chediak é exemplar na forma com que preserva a típica
atmosfera sórdida da obra do teatrólogo e, ao mesmo tempo, consegue adaptá-la
para um conceito cinematográfico. Isso fica evidente na meia-hora inicial do
filme, praticamente sem diálogos, em que a câmera percorre cenários de cortiços
e ruas, seguindo seus personagens e delimitando com precisão a ambientação suja
e escura daquele universo. Quando o trio de protagonista
finalmente parte para o conflito dramático em diálogos viscerais e
perturbadores, não há a sensação de teatro filmado – Chediak descarta a
empostação, e obtém um notável naturalismo nas atuações de Jece Valadão, Glauce
Rocha e Emiliano Queiroz. A tensão é palpável e constante, mesmo que a origem
dos conflitos se dê por mesquinharias e futilidades. Talvez seja justamente
isso que traga a permanente sensação de incômodo em “A navalha na carne” – a gratuidade
das agressões em um meio em que sentimentos e a própria vida parecem não valer
grande coisa.
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