quinta-feira, abril 03, 2014

Cidade cinza, de Marcelo Mesquita e Guilherme Valiengo **1/2


Os dilemas que envolvem o grafite como meio de expressão cultural tanto refletem discussões contemporâneas como atemporais sobre a natureza da arte e a sua importância para a sociedade. Fenômeno típico desses tempos urbanos e caóticos que vivemos, o grafite tem dificuldade em receber um reconhecimento amplo e oficial como arte pelo fato de ter sua origem vinculada às ruas e mesmo a um certo caráter transgressivo. Afinal, as pinturas são feitas em muros e paredes públicos e particulares, assim como seu “gêmeo” existencial, a pichação – esse último, de modos e fins absolutamente “foras-da-lei”. O documentário “Cidade cinza” (2012) expõe tais dilemas ao analisar casos pontuais que mostram o conflito entre consagrados grafiteiros brasileiros com a prefeitura municipal de São Paulo, quando essa tinha por alcaide Gilberto Kassab. O filme não tem o mesmo grau de contundência dramática e nem o formalismo sujo de “Luz, câmera, pichação” (2011), obra documental que versava sobre as origens da pichação no Brasil, mas mesmo assim oferece um interessante retrato temático, principalmente quando evidencia que a visão repressiva e mesquinha de burocratas acaba se tornando o único parâmetro fático para que o trabalho criativo e minucioso de artistas seja apagado ou destruído sem qualquer possibilidade de discussão em nome da assepsia visual e de um discutível “bom gosto” estético. E a partir desse caso particular, mostra também a mentalidade provinciana de governo e sociedade ao se verem diante de manifestações artísticas que destoam dos ditames óbvios e superficiais do que habitualmente é vendido como “entretenimento saudável”.

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