sexta-feira, março 27, 2015

O amor é estranho, de Ira Sachs ***1/2


Em “Deixe a luz acesa” (2012), o diretor Ira Sachs focava sua narrativa em um conturbado relacionamento gay marcado por sexo, drogas, traições e várias separações e reconciliações, com uma abordagem formal bastante crua. Na comparação, e numa primeira impressão, “O amor é estranho” (2014) pode soar mais agridoce na forma do registro sereno que Sachs usa como referência ao tornar a ter um casal homossexual como protagonista da trama. Nessa produção mais recente, esses personagens principais, mais velhos, evidenciam uma maturidade emocional e mesmo um momento de vida de maior estabilidade. O ponto de conflito do roteiro está justamente no universo que circunda o casal. Quando a necessidade de que por uma questão econômica e logística faz com que os dois precisem se separar de forma temporária e tenham de morar com parentes e amigos ficam expostos de forma sutil e engenhosa os preconceitos morais e desconfortos sociais daqueles que pareciam tão receptivos ao seu relacionamento. Sachs evita estardalhaços emocionais e arroubos de sofisticação afetada – a narrativa se desenvolve com uma fluência notável, com personagens e situações ganhando uma caracterização aprofundada e sem apelações para caricaturas e estereótipos (nesse sentido, colaboram muitos as atuações repletas de nuances dramáticas de John Lithgow e Alfred Molina nos papéis do casal protagonista). A fotografia de tom crepuscular e a atmosfera melancólica e sóbria configuram “O amor é estranho” como um conto moral cortante na fina acidez com que ironiza as mesquinharias das relações humanas.

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