É claro que “Rainhas & país” (2014) não se enquadra no
mesmo nível artístico de obras-primas clássicas do cineasta britânico John Boorman
como “Amargo pesadelo” (1972), “Excalibur” (1981) e “Esperança e glória” (1987)
– essa última, por sinal, produção da qual essa mais recente é continuação
natural. Ainda assim, é um trabalho de relevo, com o veterano diretor
conduzindo sua narrativa com uma elegância formal notável. Assim como já havia
feito no ótimo “O alfaiate do Panamá” (2001), Boorman se vale de um gênero
tradicional, no caso o melodrama, e de elementos estéticos e temáticos que
beiram o clichê para construir a sua narrativa. Encenação, enquadramentos e
edição formam um conjunto marcado pela clareza audiovisual e ausência de
maiores invencionices. Essa opção pela convencional, entretanto, não resulta em
assepsia ou irrelevância. O grande barato do filme é justamente transcender a
partir daquilo que é aparentemente óbvio e banal. Por trás de uma trama
memorialista e de fortes tons românticos, há um subtexto contestador e repleto
de fina ironia. Com sutileza, Boorman questiona a opressiva disciplina militar,
o vazio da retórica nacionalista que incentiva guerras oportunistas, o
moralismo familiar e até mesmo a alienação insensível do dito amor romântico. O
processo de amadurecimento do protagonista Bill Rohan (Callum Turner) é
mostrado de forma convincente e com consistente dimensão humanista. Assim, “Rainhas
& país” se mostra muito além de ser uma mera sequência oportunista,
reforçando o expressivo traço autoral da cinematografia de Boorman.
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