Nesta produção de 1961, o diretor Roberto Pires estabelece um panorama narrativo intrigante da capital da Bahia que transparece ousadia mesmo nos tempos atuais. Vários aspectos daquele microcosmo se complementam na trama: preconceito racial, marginalidade, sincretismo religioso, conflitos sociais, sexualidade a flor da pele, violência. Não há protagonistas bem definidos, com o roteiro fazendo desfilar uma série de tipos característicos da sociedade de Salvador (e que refletem, de certa forma, as próprias divisões da sociedade ocidental). Pires consegue manter uma atmosfera de constante tensão em “A Grande Feira”, mesmo que ainda não apresente o apuro formal que posteriormente demonstrou em “Máscara da Traição” (1969) e “Césio 137” (1990). Ainda assim, impressiona por juntar planos narrativos diversos de forma coerente e fluida. Colabora para isso a edição ágil (cortesia de um Glauber Rocha em início de carreira) e a direção de fotografia que não transforma a ambientação de Salvador em meras imagens estilo cartão postal, privilegiando tanto os tons luminosos que aludem a um clima de sensualidade como os visuais noturnos e sombrios que conferem à cidade uma textura misteriosa e até mesmo assustadora.
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