A continuação do clássico “O Bandido da luz vermelha” (1968)
vai muito além do mero oportunismo ou da necrofilia nostálgica em torno do
culto à obra de estreia de Rogério Sganzerla. Até porque “Luz nas trevas”
(2010) se baseia em roteiro original do próprio Sganzerla. O filme de Helena
Ignez tem brilho próprio. É claro que elementos estéticos do “Bandido...” estão
ali presentes também na produção mais recente, mas a diretora soube recriá-los
de forma coerente com o cinema contemporâneo, evidenciando o quanto a
obra-prima de Sganzerla era visionária. Nas duas obras, fica claro que o fator
diferencial do cinema como linguagem particular é a montagem. Em “Luz nas
trevas”, a edição engloba a encenação dramática atual, cenas de “O bandido...”
e mais alguns trechos documentais, em meio a várias citações musicais. O tom é
falsamente aleatório – no meio do caos e de uma encenação anti-naturalista, há
uma ordem peculiar, em que o espírito dionisíaco das imagens e o discurso delirante
dos personagens mostram não só o universo artístico de Sganzerla e Ignez, mas
também a própria essência da alma cultural e artística do Brasil, em que o
erudito e o popular convivem sem maiores cerimônias. Talvez aí esteja o segredo
do impacto de “Luz nas trevas”: por mais que as referências e a formatação do
filme sejam complexas, o resultado final é insolitamente divertido, distante do
hermetismo estéril.
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